sexta-feira, 28 de setembro de 2012

A pior saudade

    Qual a pior saudade? A dos amigos, familiares, ou a do primeiro amor? Sem querer dar uma de egoísta, mas a pior saudade que podemos ter é a de nós mesmos. Quando paramos no tempo e começamos a nos lembrar do passado para termos momentos de alegria e então sorrimos, é sinal de que o presente não está tão bom assim. Eu tenho essa saudade. Saudades de um cara distraído, até meio bobão, que não reparava em nada em sua volta.
    Resolvi tocar nesse assunto, pois, na semana passada, resolvi gravar alguns vídeos para um trabalho de faculdade para uma estudante de administração.
    Na hora de gravar os vídeos fiquei tenso, travado, os músculos contraídos. Consequentemente as ideias não saíram com naturalidade e não falei fluentemente, chegando até mesmo a gaguejar. Não estava falando para uma platéia de mil pessoas, ou gravando algo em uma emissora de tv, estava apenas em frente a uma webcam, e sozinho!
    Quando clico no botãozinho da câmera para começar a gravação, inúmeras perguntas invadem minha mente, tento me concentrar, mas não consigo, e às vezes me perco no meio da gravação e repito algumas coisas. Mas mesmo assim resolvi continuar a gravar os vídeos e os mandei assim mesmo para a estudante, sem cortes. Não gosto de parar a gravação quando erro ou gaguejo, quero que tudo seja da maneira mais natural possível, mesmo com todos os erros ou falhas.
    Minha mente volta ao um passado distante, há cerca de vinte anos atrás, quando era apenas um cara que não reparava nada em sua volta. Chego a me lembrar da época em que trabalhava como operador de som em uma cidade próximo de onde moro atualmente. Estava trabalhando em um festival de música e a repórter da afiliada da Globo aqui da região perguntou-me se poderia fazer algumas perguntas. Eu, com a maior naturalidade, respondi que sim. Não tive receio nenhum, não pensei em nada e na hora de gravar tudo saiu com a maior naturalidade. A única coisa que cheguei a pensar na hora é que iria aparecer na TV, e confesso que fiquei todo bobo com essa ideia.
     Comparo essas duas experiências que tive com uma câmera e fico profundamente triste. Como posso ficar assim hoje em dia, em frente de uma simples webcam? Fico pensativo e chego a duvidar se existe ou existirá um medicamento para isso, que deixe a mente tranquila sem deixar que o corpo padeça e que não cause tantos efeitos colaterais.
    Volto então a me lembrar de outras situações da época em que trabalhava como operador de som. Tinha que ficar no meio da multidão nos shows, e isso não me incomodava em nada, até quando as paranoias começaram a tomar conta de minha mente. Me lembro de algumas tardes de domingo aqui em Ipatinga, onde tinha que fazer a sonorização de um bingo de automóveis que acontecia no estádio aqui da cidade, com capacidade para trinta mil pessoas na época. Creio que até poderia ter mais pessoas nos bingos, pois, quando se olhava para as arquibancadas, não se via nenhum espaço vazio. Mas, para mim, naquela época não havia nenhuma diferença se o estádio estava lotado ou não. Instalava a mesa de som debaixo do palco, que era montado no meio do campo. Colocava a mesa em uma altura em que dava para operá-la sentado na grama mesmo, e, para completar tirava o tênis para poder pisar na grama e sentir a energia da terra. Não sei se isso acontece com todos, mas sinto uma energia boa quando piso na grama ou na areia. Caminhar descalço na grama ou na areia é um bom exercício para se tirar o stress. O bingo então começava e era só uma questão de tempo para que o evento terminasse, pois não reparava em nada e não tinha nenhuma preocupação, apesar de ser um serviço de muita responsabilidade, pois, se as pessoas que compraram as cartelas não ouvissem em alto e bom som os números, com certeza iriam ficar revoltadas e começariam a vaiar o operador de som.
  Volto ainda mais na linha do tempo da minha vida. Na sala de aula, por volta dos doze anos de idade, apresento um trabalho de grupo em frente ao quadro negro. Estou super tranquilo, sem receio nenhum e as palavras saem com a maior naturalidade. Consigo visualizar os meus colegas que  ficavam admirados com o que eu dizia, até parecia gente grande.
    Indo um pouco a frente, me lembro de alguns shows em que fui, e a única coisa em que reparava era a banda, nas músicas, nos sons, somente isso.
A última vez que fui a um show foi no ano de 2006, e me lembro que sai de lá com a musculatura das costas e do pescoço bem dolorida, por causa da tensão em que fiquei. Hoje tenho alguns problemas em relação aos dentes, algo parecido com o bruxismo, mas só que acontece de dia. Não chego a ficar batendo os dentes um contra o outro, durante a noite,  mas sinto que fico pressionando os dentes de cima contra os de baixo,  e isso já até causou desgaste em alguns, pois a pressão interna do dente é tão grande que acaba trincando-o, devido ao stress.
    Foi em 2006 que também foi a última vez que fui à um estádio de futebol para ver o meu time jogar. Estava precavido, com dois comprimidos de diazepan no bolso, mas, infelizmente, na hora eles não surtiram efeito, e então tive que recorrer a duas latinhas de cerveja, para tirar um pouco da tensão. Não recomendo que ninguém faça isso, foi um caso de emergência, ou eu pirava ou então voltava para casa. Mas, como era o meu time do coração e o jogo era decisivo...
    Já em 2009, o meu time voltou a jogar aqui em Ipatinga, mas eu nem cogitei a ideia de comprar um ingresso. Foi ai que percebi que o caso era grave.
    Volto ao presente e percebo que, de noite,na maioria das vezes, dá para se contar as palavras que foram ditas por mim durante o dia. Atualmente estou monossilábico, as palavras mais ditas por mim ultimamente são: sim, não, talvez, só. Quando estou um pouco animado, entro no msn para digitar algumas palavras e trocar algumas ideias com os amigos virtuais, geralmente pessoas que tem o mesmo transtorno que eu tenho ou algo parecido.
    Quando vou à padaria, compro pão suficiente para uns quatro dias, para que eu saia de casa o menos possível. Ou seja, não como pão dormido, e sim pão hibernado. É meio ruim comer o pão assim, mas, pesando os prós e os contras, é melhor do que ir à padaria todos os dias.
    Desculpem-me se estou saudosista demais hoje. Mas, afinal, isso também pode acontecer com qualquer um, afinal, quem nunca chegou a sentir saudades de si mesmo? Não falo tanto no aspecto físico, a saudade de quando uma pessoa fica mais madura e sente saudades do tempo em que tinha mais energia e beleza física. Falo mais no aspecto emocional e psicológico mesmo. Será que, quando nos tornamos adultos e conhecemos como funciona certas coisas em alguns setores da sociedade, não sentimos saudades de quando éramos inocentes e não conhecíamos a maldade humana? Será essa saudade um componente da esquizofrenia e a causa de uma possível negação da realidade? Um mundo cheio de injustiças, maldades, crueldades, talvez não seria um motivo para uma pessoa criar um mundo só seu? Será que existe um medicamento que solucione os problemas da alma? Sinceramente não sei, quanto mais me aprofundo no tema, mais interrogações aparecem em minha cabeça.
 

20 comentários:

  1. é muito nostalgico isso. eu prefiro pensar no futuro, ou fazer o que tenho que fazer, ao invez de olhar pra tráz... ninguem consegue nada olhando pro passado.. mas, é uma reflexao sua, respeito, eu entendo o que é ficar estagnado com esquizofrenia...

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    1. Obrigado por visitar o blog. Olhar para o passado é uma reflexão que infelizmente acontece, devido a situações que acontecem no presente, e não há como evitar essas comparações. Se pudesse deletar tudo o que aconteceu em minha memória, como se fosse um computador, certamente faria isso, mas as coisas não são tão simples assim.

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  2. Olá, Julio..(Acho que seu nome é Julio pelo nome autor do livro, não sei..)
    Adorei o que escreveu, porém faço um reparo: não se isole, tente se tratar, consiga uma terapia. Quanto mais nos isolamos mais dificil fica para se socializar. Não coma pão dormido, enfrente esse medo das pessoas, elas também tem lá seus problemas. Vai em frente. E afinal, a vida é feita mesmo de saudade: do tempo que passou, do corpo que não temos mais. Só que somos seres humanos , estamos em constante transformação, precisamos seguir em frente. Parabéns pelo blog e pela sua sensibilidade! Fique bem, (não me identifico porque sou psicanalista e prefiro não fazê-lo). Abraços.

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    1. Olá, meu nome é esse mesmo. Obrigado pela visita ao blog. Em relação a terapia, tratamento, é complicado quando dependemos do sus. Infelizmente a psiquiatra acha que o meu caso está resolvido, que estou estabilizado. Ela não entende que o que acontece é que não estou tendo mais os sintomas positivos, estou mais na fase dos sintomas negativos. Então, hoje em dia, nem consulto mais com psiquiatra aqui na cidade, simplesmente pego a receita com um clinico geral que atende os pacientes em dois minutos. Não é brincadeira não, na quarta feira fui pegar a receita, e uma mulher, preocupada com o horário e quantidade de pessoas a serem atendidas, resolveu cronometrar o tempo em que uma pessoa era atendida. E por incrível que pareça, uma pessoa que ela cronometrou o tempo, foi em dois minutos. Sinto que preciso de algo para ajudar em relação aos sintomas negativos, mas não tem como fazer isso com um clinico geral, ainda mais em dois minutos. Como muito chocolate para ficar mais animado, bem humorado, mas os meus triglicerides estão em 580mg, ou seja, quase o triplo do limite aceitável. Vou tentar o ômega 3, se não der certo, eu mesmo vou ter que olhar um antidepressivo aqui na net e pedir a receita para o clínico geral. Ou seja, além de me diagnosticar, tenho que pesquisar um medicamento apropriado e a dosagem também, pois esse médico nem sabia preencher a receita do diazepan, que é um simples remédio para ajudar a dormir.

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  3. Ah, "One Man`s Dream "é lindo...mostra o quanto é sensível..( o anônimo de cima, ok?)

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    1. Yanni é muito bom para relaxar, tiro o chapéu para ele, pois esse cara é autodidata. Se é difícil aprender música com bons professores, imagina por conta própria? Hoje ele se apresenta com uma orquestra enorme. Uns dizem que isso é dom, que nasce com a pessoa e tudo mais. Eu acredito que possa ser isso, mas se a pessoa não se esforçar e estudar muito, não chega a desenvolver o dom. Ou seja, é um união de levar jeito pra coisa e esforço e estudo.

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    2. Julio,
      Bom dia!!!Lendo sua resposta, fiquei bem assustada com a falta de infra-estrutura em sua cidade para saúde mental. Qual a sua cidade, Ipatinga? Vou me informar para ver se consigo algum lugar que lhe atenda, porque existem em núcleos psicanaliticos que atendem por preços baixos e são excelentes ..Quem sabe consigo alguém que lhe ajude. Porque se está numa boa situação, com controle dos sintomas , a terapia poderá lhe fortalecer para conseguir sair, fazer as coisas normalmente.
      Quanto ao ômega3, ouvi falar que ele faz bem , sim , para esquizofrênia, depressão , mas a dosagem precisa sem bem elevada, não sei ao certo quanto , me parece que seriam umas 6 cápsulas por dia. Tente ver com um médico, porque não sou médica, e sim, psicóloga. Tenha um bom fim de semana.

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    3. Até que o atendimento era bom, mas o atual prefeito deixou a cidade bem desorganizada, para não falar outra coisa. O município deve ter uma boa arrecadação, principalmente por causa da usiminas, mas esse prefeito atual está no cargo pois o vencedor das últimas eleições não pode assumir, acho que por estar com a ficha suja, e segundo colocado também não pode assumir, pois ficou comprovado que ele exagerou nas verbas durante a campanha. Ou seja, ou o atual prefeito não tem condições para exercer o cargo ou então é mal intencionado mesmo. Em relação ao ômega 3,pelo que pesquisei a dosagem é de 1000mg, e tem cápsulas concentradas, com essa dose. Vou experimentar, já que é um produto natural e também tenho que diminuir os triglicerídeos. Obrigado.

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  4. Demorou pra você receber o diagnóstico de que era esquizofrênico?

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    1. Olha, na minha primeira consulta, o psiquiatra em menos de dez minutos já me passou a receita do remédio. Infelizmente no sus as coisas são assim na maioria das cidades. Me lembro que as pessoas que foram atendidas antes de mim também demoraram esse tempo. Ou seja, fui diagnosticado em cerca de cinco minutos, sendo que na época eu estava muito bem, já estava recuperado do meu primeiro surto, sem os medicamentos. Ele perguntou o que eu tive e não como eu estava me sentindo no momento, talvez eu precisasse mais de esclarecimentos do que de medicamentos naquela época.

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  5. Mas, o psiquiatra te deu o remédio, e disse "Você é esquizofrênico", ou só receitou o remédio mesmo?

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    1. Ele só receitou o remédio mesmo, não respondeu as minhas perguntas, pela falta de tempo mesmo. Me lembro que cada paciente era atendido em cerca de sete minutos, mais ou menos. Só fiquei sabendo mesmo com clareza que tinha esquizofrenia três anos mais tarde, quando fui fazer uma perícia no INSS e ai eu li o laudo do psiquiatra. O que eu sinto é que, em alguns casos, os psiquiatras e as psicólogas parecem ter receio de contar a verdade para o portador, com medo que não aceitem o diagnóstico, ou então ainda tem dúvidas sobre o diagnóstico mesmo, pois alguns sintomas são bem parecidos com os de um bipolar.

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  6. Tem CAPS na sua cidade?

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    1. Tem um, mas a psiquiatra disse que o meu caso está estabilizado e hoje eu pego os medicamentos no posto de saúde mesmo, com um clínico geral. Eu sinto que não está totalmente estabilizado, só passei dos sintomas positivos para os negativos, mas não sei como se trata os sintomas negativos, se é com antidepressivos ou com os antipsicóticos mesmo. Tenho receio de ficar experimentando muitos medicamentos e complicar ainda mais as coisas, estou tentando parar com o diazepan agora, mas na sexta pro sábado fiquei com dores de cabeça e o coração disparando. Tenho que ir parando aos poucos, pois sei que pode causar problemas.

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  7. Oi amigo!
    Desculpe,sou leiga neste assunto,mas eu tive depressão prufunda e síndrome do pânico.Começou em março deste ano.Fui a dois psiquiatras e falei c/ eles sobre a vontade de me isolar,de ir só uma vez ou outra ao mercado,etc.Imagina eu com dois filhos p/ dar atenção,aí é q eu mais pirava.Comecei o tratamento c psicóloga e psiquiatra,tomo fluoxetina c/ bromazepan (formula) para o dia,me dá mais vontade de caminhar,passear na areia da praia,fazer minhas tarefas diárias.E alprazolam de 2mg para dormir.Mas busquei tratamento espiritual num centro espírita Kardecista,e senti q este foi o melhor remédio.Continuo frequentando as reuniões,fiz amigos,dakeles q vc conversa dois min. e está ótimo,pq a vontade de voltar logo p/ casa é tensa! rsrsrs.
    Busque ajuda espiritual tbm,ñ fique só pensando em remédios,nós temos uma força incrível dentro de nós e não sabemos como usá-las.
    Um grd abraço fraterno! E tenha a certeza q vamos sair dessa!

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    1. Olá
      Fico feliz por estar superando a depressão. Concordo com você, não devemos ficar só na questão do remédio, devemos nos olhar como um todo, fisicamente, espiritualmente e psicologicamente. Em relação a ajuda espiritual, acho que isso pode ser válido, mas, se for mal administrada essa questão, pode até agravar o quadro, principalmente quando se trata de esquizofrenia. Muitas vezes, nós, esquizofrênicos, não temos muito bem resolvida essa questão, principalmente quando se trata de religião. Obrigado por visitar o blog e se você está se sentindo bem na doutrina kardecista, continue nela, pois acredito que não existe donos da verdade nesse mundo.

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  8. oi , tudo bem você acha que a esquizofrenia tem cura,
    e quanto ao inss eles te aposentou. abraços.

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    1. Na minha opinião, a esquizofrenia ainda não tem cura, pois não é só o fator biológico que conta, entra também a parte psicológica do indivíduo. Acho que tem controle, mas não cura. Eu me aposentei há três anos atrás.

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  9. Olá Julio Cesar , tudo bem , acompanho seus vídeos e sofro de fobia social e vi em um de seus vídeos que você fez curso de computador e eu tinha feito um curso de cabeleireiro e não tinha coragem de exercer pelo mal estar que sinto ao me encontrar com pessoas e então resolvi abrir o meu pequeno salão só de corte masculino , há dias que eu estou mais atacado , outros não , más as pessoas não percebem pois escondo os sintomas que são uma avalanche de sentimentos e medos irracionais e me trato com psiquiatra e tomo remédios , tenho 44 anos e nunca me casei , afinal nasci com este transtorno , antes só trabalhava como ajudante de pedreiro , queria que você me desce uma dica ,se possível, de como me acalmar na crise pois ela não impede meu raciocínio e nem minha cordenaçao motora más dificulta eu escutar e entender o que a pessoa está falando e caso eu entenda dificulta a resposta devido a aceleração de pensamento e idéias . Me fale sobre você como está sua viajem , é sempre que você tem que dormir no chão e comer marmitex ? quais são seus planos e onde pretende arrumar mais um quartinho ? está aproveitando as andanças ? Um Abraço e que Deus lhe proteja.

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  10. Desculpe pela demora em responder a sua pergunta. Em relação a uma dica sobre esse mal estar que você sente ao ter contato com as pessoas, eu também procuro, para falar a verdade. Tirando as poucas pessoas que eu conheço, na maioria das vezes é um pouco estressante esse contato com as pessoas. Eu procuro sempre respirar bem, tentar relaxar a musculatura, mas é bem complicado mesmo. Obrigado por visitar o blog.

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