quinta-feira, 27 de junho de 2013

Estrada Real: 22º dia



29 de maio de 2013-quarta feira
Aparecida do Norte-Guaratinguetá-Cunha

    Para variar, sou acordado às cinco horas da manhã pelo vigia do albergue. Mas por que será que todos os albergues têm que acordar as pessoas neste horário? Não dá para pelo menos esperar o dia clarear? Eu e mais quatro caras tomamos o café da manhã e fomos para a rodoviária. Depois, cada um foi para o seu destino. Tinha um cara de São Paulo que ia para Paraty a pé também, só não fui com ele pois não poderia perder a oportunidade de conhecer a basílica por dentro. 
    Fico vendo a TV em uma lanchonete, e a previsão do tempo não é das mais animadoras. Segundo os noticiários matinais, haverá chuva no transcorrer do dia em todo o estado de São Paulo. Os dois últimos dias foram semelhantes, em relação ao tempo: sol de manhã e muita chuva de tarde. 
    Fico sem saber o que fazer, num dilema terrível. É uma decisão muito difícil a que tenho que tomar, pode parecer frescura, mas, afinal, foram quase 600km de caminhada. Penso em fazer esses 110km finais na base do sacrifício, mesmo debaixo de forte chuva. Além de incomodar muito, a chuva não deixa curtirmos o caminho, as paisagens, parar para descansar e refletir. Então descarto essa ideia, pelo menos por enquanto. Se pelo menos no final do dia pudesse tomar um bom banho e dormir em uma cama bem macia nesse final, eu seguiria tranquilamente. Mas, analisando as planilhas, entre Guará e Cunha, e entre Cunha e Paraty, dá para notar que não tem lugares para descansar, a não ser pousadas bem caras.
relógio das flores
     Novamente cogito em pegar um ônibus para Paraty, mas analisando bem as coisas, tiro essa ideia de minha cabeça. Seria um final muito frio e sem graça para essa aventura tão legal. Tem que ter emoção, suor, sacrifício. Não combina comigo chegar ao final da luta limpo e na maior facilidade. Tudo em minha vida foi na base da luta, e nessa viagem não poderia ser diferente.
    Fico então tentando achar uma solução para esse dilema. Não tenho grana para me hospedar em um hotel e esperar o tempo melhorar. Conversei com o pessoal do albergue de Aparecida, contei toda a história da caminhada, mas eles não se sensibilizaram e disseram que não poderiam abrir uma exceção para mim e eu só poderia ficar uma noite apenas. 
    São sete horas da manhã e resolvo visitar a basílica. Fico impressionado com a construção. Não tanto pela beleza, mas sim pelo tamanho e pela imponência. O espaço é tão grande que não sei nem por onde começar a tirar as fotos. Afinal, é a segunda maior basílica do mundo, perdendo apenas para a do Vaticano.

    Não há muitos turistas, creio que no feriado de amanhã a cidade deva estar bem cheia. A basílica tem uma estrutura muito boa: ótimos banheiros, setas que indicam os locais a serem visitados, tudo muito limpo mesmo. Visito a imagem da padroeira, apesar de não ser devoto. Respeito a fé e a crença de cada um, menos as religiões que prometem melhorar a vida financeira da pessoa, pedindo dinheiro. A verdade é que estão melhorando a vida financeiro é a do bispo né? 
    Depois da visita a basílica, vou a uma lan house para saber uma previsão mais detalhada sobre o tempo para os próximos dias. Acesso primeiro o blog, respondo alguns comentários, mas logo a net cai e, como demora para voltar, volto para o albergue para almoçar, sem saber ainda o que fazer neste final de viagem.
    Depois de saciada a minha fome, volto para a rodoviária. Sento-me em uma cadeira e continuo a refletir sobre o que fazer. O céu está nublado e pode chover a qualquer momento. Tenho que sair de Aparecida hoje, isso é certo, já que amanhã, por causa do feriado, a cidade deve ficar lotada de fiéis. Decido então seguir para Cunha de ônibus, a fim de ganhar mais um dia e resolver o que fazer e esperar se o tempo irá melhorar ou não.
em Aparecida também tem os apóstolos
     Em Cunha, acesso a net e os sites não são unânimes sobre a previsão do tempo. Alguns dizem que irá chover na região, enquanto outros dizem que o tempo irá ficar apenas nublado. Acabo então chegando a conclusão que não posso ficar dando muita bola para essas previsões do tempo. Na TV, hoje, disseram que iria chover. o que não ocorreu, e perdi um dia de caminhada. 
   Dou uma boa olhada no dedão do meu pé esquerdo e vejo que o ferimento está quase que totalmente curado. Vai dar para calçar o tênis. Andar na lama com chinelo é muito complicado. O fato de poder andar calçado me motivou e muito. Uma imensa vontade de concluir o caminho a pé tomou conta de mim e decido então fazer o restante do caminho amanhã, mesmo que chova canivete. A verdade é que estava me sentindo meio culpado por ter andado cerca de 70km de ônibus, não estava fazendo parte do script isso. 
    Espero que o tempo ajude, pois essa região é serrana e faz muito frio. E frio e chuva não é uma combinação muito legal. 
     Depois de dar uma volta pela cidade, vou para a rodoviária, que foi o local mais tranquilo que achei para montar a minha barraca e dormir. Tenho que dormir bem e acordar melhor ainda, pois esse final é muito difícil de ser percorrido.

    Essa música é de uma banda mineira. o 14 Bis, que fez muito sucesso na década de 80. Eles fizeram essa música juntamente com o Renato Russo e vale muito para o momento atual da viagem. Claro que eles não falam sobre o sol no sentido literal, claro que é subjetivo, mas vale também.



Mais uma vez  14 Bis

Mas é claro que o sol
Vai voltar amanhã
Mais uma vez, eu sei
Escuridão já vi pior
De endoidecer gente sã
Espera que o sol já vem
Tem gente que está do mesmo lado que você
Mas deveria estar do lado de lá
Tem gente que machuca os outros
Tem gente que não sabe amar
Tem gente enganando a gente
Veja nossa vida como está
Mas eu sei que um dia a gente aprende
Se você quiser alguém em quem confiar
Confie em si mesmo
Quem acredita sempre alcança
Nunca deixe que lhe digam
Que não vale a pena
Acreditar no sonho que se tem
Ou que seus planos nunca vão dar certo
Ou que você nunca vai ser alguém
Tem gente que machuca os outros
Tem gente que não sabe amar
Mas eu sei que um dia a gente aprende



-obs: Lais, por favor, se estiver vendo o post, entre em contato comigo, me add no facebook, é só clicar em contato e copiar o link do facebook. Apaguei sua mensagem por ser algo particular e foi a única forma que encontrei para lhe responder. 

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Estrada Real: 21º dia


28 de maio de 2013
Vila do Embau-Lorena-Guaratinguetá-"Aparecida do Norte"
manhã não muito animadora

    Não encontrei nenhum lugar para tomar um bom banho em Vila do Embau. Antes, há muitos anos atrás(muitos mesmo!), confesso que conseguia dormir sem tomar banho, era muito desleixado com a higiene(hoje sou só um pouco), mas atualmente não consigo pegar no sono sem entrar no chuveiro. Também não consegui papelão, e a noite foi das mais frias até hoje. 
    Como disse, no post anterior, o único lugar coberto que encontrei para dormir foi um ponto de ônibus. Às cinco e meia da tarde já havia escurecido, como se fosse de noite. Às seis, já estava descansando minhas canelas em minha barraca.
    Por volta das sete, três caras foram ao ponto de ônibus para acenderem um baseado. Estavam ouvindo funk, para piorar a situação. Começaram a puxar conversa comigo, me ofereceram a erva danada, e eu, dentro de minha barraca, recusei. Acho que já disse isso antes, não preciso de drogas, não preciso de artifícios par fugir da realidade. Acho que vivo a minha realidade dentro da realidade desse mundo. Uma vez, me disseram que, se tomasse determinado medicamento, eu iria ficar mais dentro da realidade. Apenas respondi, perguntando:
    - E quem disse que eu quero entrar nessa realidade deste mundo? Talvez a minha realidade seja melhor de se viver. 
    Voltando a viagem, os caras demoraram para ir embora. Falaram sobre drogas, sobre a barraca, e outras coisas mais. Confesso que cheguei a ficar um pouco receoso, afinal, era a minha primeira noite em terras paulistas. Pensei que os caras estavam procurando saber quem estava na barraca, para voltarem mais tarde e me roubarem. 
    Por precaução, não tomei o meu "pan de cada dia" e por isso não  consegui dormir. Acordei cansado, mas animado, pelo fato da chuva ter dado uma trégua.
muita lama no caminho
     O começo do caminho para Guaratinguetá é uma trilha, que estava bem complicada de se percorrida, devido a chuva. Ainda mais por que estava de chinelo, que a todo momento ficava grudado na lama, além de ficar muito pesado com o barro que ficava impregnado na sola. 
chegada em Lorena
    Depois da trilha, asfalto e estrada de terra até Lorena. A estrada de terra é boa, mas com muito movimento de carros e principalmente de caminhões. Tem muitas fazendas na região e quase todo o trecho inicial tem cerca dos dois lados. Foi difícil achar um local mais reservado para fazer a necessidade básica do dia a dia. Tive que contar com a sorte também para não ser pego no flagrante.
cidade de Cachoeira Paulista, a construção maior é o templo da Canção Nova
     Como não havia dormido bem, a caminhada não rendeu muito. Tive que parar várias vezes para descansar, e, como Guaratinguetá está a 38km de Vila do Embau, decidi percorrer apenas 20km e parar na cidade de Lorena.
    Quando estava prestes a chegar ao centro de Lorena, ela, a temida chuva, apareceu novamente na parte da tarde, como no dia anterior. Consegui pegar um ônibus até o centro da cidade, e, como não havia nenhum albergue na cidade, resolvi pegar um outro ônibus até Guaratinguetá. Passagem baratinha, cheguei a me espantar com o preço:2,90 reais! Afinal, eu estava me deslocando de um município para outro, e a distância era considerável, e paguei o mesmo que teria que pagar se me deslocasse de um bairro para outro em Belo Horizonte.
    Em Guará, fiz um bom lanche na rodoviária, já que não havia almoçado. Coxinha, empada, torta de chocolate e dois pedaçoes de pudim de leite de sobremesa. Já que o tempo não estava ajudando, pelo menos tinha que tirar a barriga de miséria né? O jeito era comer e comer mesmo. Após me informar, fiquei sabendo que somente na cidade vizinha de Aparecida é que havia um albergue. Fiquei mais surpreso ainda com o preço dessa passagem:2,25 reais! Nunca havia cruzado três municípios em um espaço de tempo tão curto em toda a minha vida.
falta pouco...
     A essa altura, já havia perdido o receio inicial de estar em São Paulo. Todas as pessoas que pedi informação foram muito atenciosas , principalmente as paulistas, que, a princípio, pareceram ser bem mais extrovertidas do que as mineiras. As mineiras são mais fechadas para com os estranhos, acho que por pensarem que os homens irão pensar que elas estão dando bola para eles, simplesmente por conversarem ou olharem para eles, mesmo sendo estranhos. Bem, não sei se deu para entender o meu raciocínio, mas acho que é mais ou menos isso. Conversei com algumas paulistas e elas foram atenciosas, algumas até sorridentes, bem legais mesmo, mas não é por causa disso que achei que estavam a fim de mim. É a cultura de cada estado mesmo. Mas que existe isso entre homens e mulheres existe, já aconteceu de, estar a fim de fazer amizade com algumas mulheres, e as mesmas pensarem que eu estava a fim delas. É uma relação um pouco complicada. Por isso, as mulheres não devem sentir ciúmes do namorado ou marido quando eles ficam muito tempo com os amigos, jogando conversa fora ou assistindo futebol, isso é coisa de homem mesmo, sentimos mais a vontade de falar palavrão, essas coisas. O inverso também acontece, os homens não devem se preocupar se as mulheres ficam a tarde inteira no cabelereiro, conversando com as amigas, é o tipo de conversa que só é feito entre mulheres mesmo. Bem, chega de falar sobre o comportamente humano e retomemos o assunto do post, que é a viagem. Dicas de relacionamento eu não sou bom, minha vida amorosa não tem sido das melhores. rsrsrs
    O tempo estava muito fechado, muita chuva mesmo. E parecia que não iria melhorar tão cedo. Estou pensando seriamente em abortar a viagem, pois não tem como subir e descer as trilhas com a terra molhada, e ainda mais de chinelo. Falta pouco para o final, eu sei, mas caminhar nestas condições levará muito tempo do que em condições normais, já que a maior parte do caminho é feito em estrada de terra. Não sei o que fazer, o jeito é esperar até amanhã para ver se o tempo melhora.
    Foi isso basicamente que pensei e refleti durante a "viagem" entre Guará e Aparecida, que durou uns quinze minutos. Estava tão preocupado e desanimado com o tempo que só me toquei que Aparecida era a cidade de Aparecida do Norte quando avistei a Basílica, já perto do ponto final. Muito linda e imponente a construção, e o espaço em torno dela é bem grande, tem até um parque de diversões ao lado. Várias lojas de artigos religiosos tomam conta das proximidades da basílica.

    Descendo no ponto final, fico sabendo que o albergue de Aparecida fica um pouco longe. Estava meio exausto, mas, na chuva sempre se arruma forças para caminhar.
     Depois de um bom tempo andando, chego ao albergue. Tomo um banho, faço a minha barba. Meus pés estão doendo um pouco, mas a minha maior preocupação é sobre o que fazer: continuar o caminho, debaixo de chuva, com frio e nas estradas de terra, ou parar e reconhecer que não vale a pena tanto sacrifício por nada? Ou será que Deus, de uma forma indireta, me levou até Aparecida do Norte, para conhecer a basílica que sempre quis visitar quando a via pela TV?

-Obs. No título do post,  coloquei o nome da cidade entre aspas, pois ela não está incluída no caminho da estrada real.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Estrada Real: 20º dia


27 de maio de 2013-segunda feira
Passa Quatro-Vila do Embau

    Sou acordado exatamente às cinco e meia da manhã pelo funcionário do albergue de Passa Quatro. Às seis, já estava na rua.
    Tive uma excelente noite de sono, que recuperou minhas energias, mas não o meu ânimo e a vontade de prosseguir na estrada real. O albergue de Passa Quatro é muito aconchegante, limpo e o funcionário fez uma ótima sopa ontem de noite.
    Os tetos dos carros estão molhados pelo sereno da madrugada. Sento-me no gelado banco da praça para esperar o supermercado abrir. Tento, em meus pensamentos, encontrar algo que me dê ânimo para seguir o caminho. Na verdade, ao fazer uma reflexão, o que está pegando tanto não é o ânimo, e sim o receio de entrar em terras paulistas. Não sei como os paulistas irão receber o mineiro aqui. Pelo que pude perceber, os mineiros não têm nenhuma rixa com nenhum outro estado. Com a chegada da internet, pude perceber claramente a rivalidade entre paulistas e cariocas, ao ver os comentários em alguns sites. Por exemplo, quando acontece algo de ruim no Rio, os paulistas entram no site de notícias e fazem comentários bem pesados. O inverso também acontece. Sinceramente, não sei como esses sites publicam esses comentários, e, quando o assunto é futebol, ai é que o nível desce mesmo.


    Me questiono se ganharei alguma coisa se chegar em Paraty, já que o caminho foi bem legal até o momento. Mas também penso sobre como seria se desistisse, já perto do final. Provavelmente não iria me perdoar nunca. É aquela história: nadar, nadar e nadar e morrer na praia. Penso também nos leitores do blog, não iria me sentir nada bem publicando um post informando a minha desistência. Como estou bem fisicamente, resolvo proseguir.
   No supermercado, compro bananas, maçãs, biscoitos. A planilha informa que não encontrarei nenhum restaurante na hora do almoço, a não ser que eu ande bem devagar

   Até Vila do Embau, foram 33km de estrada de terra, trilhas e asfalto. Queria muito calçar o tênis, para poder acelerar a caminhada, mas o dedão do pé ainda não está 100% curado.
   No caminho, saindo de Passa Quatro e entrando no asfalto, não encontro o marco 1218, e tive meio que deduzir o caminho a seguir, pois os motoristas dificilmente param em estradas de asfalto. É muito ruim caminhar na incerteza até conseguir achar o marco seguinte. 
    Por volta das dez e meia já estava na divisa dos estados de Minas Gerais e São Paulo. Foi uma sensação legal que tive, como se estivesse cumprido uma etapa do caminho. As terras paulistas são uma incógnita para mim, e o desconhecido, ao mesmo tempo que me dá um pouco de medo, também me aguça a curiosidade.

    Saio do asfalto e entro em uma trilha na serra da Mantiqueira, que parece terminar em uma solitária propriedade com muitos pés de mexerica. Como não estava mais avistando os marcos, começo a bater palmas para ver se havia alguém em casa para me informar sobre a trilha. Quem me atende é um senhor aparentando ter uns 55 anos de idade, mais ou menos. O cara é super gente boa, com seu jeito de caipira me diz que os marcos da trilha foram jogados no chão há quatro anos atrás e que nunca foram colocados em seus devidos lugares, para orientar o viajante.
os marcos não foram colocados, a esquerda, a barriga do gente boa seu Jair
    Ele então me dá as coordenadas para seguir a trilha, e me alertou sobre as temíveis cobras urutus, que são comuns na região. Cortou um pedaço de árvore e me deu, para que eu pudesse me defender de um eventual ataque dessas cobras. Mas, antes de seguir o caminho, o seu Jair, me convidou para o almoçar. Claro que aceitei, não poderia recusar uma gentileza dessas. Conheci sua esposa, a dona Sônia, que é bem tímida. Conversamos um bom tempo enquanto almoçávamos. E eu sempre achando divertido o jeito caipira do Jair de conversar. 
   -Você é de onde?
   -Belo Horizonte.-respondo.
   - Tudo quanto é pessoa que passa aqui é de Belo Horizonte! Outro dia passou uma mulher com uma bicicleta que só faltava falar!- ele disse, e eu achando maior graça.
    -É que o mineiro gosta de caminhar...
    Foi difícil me despedir do seu Jair. Sua simplicidade e generosidade me deixaram muito feliz e aumentou a minha motivação de proseguir o caminho. Comecei a gostar de caminhar pelo estado de São Paulo.
    Olho a trilha e vejo que ela entra em uma mata bem fechada. Olho a planilha e fico na dúvida; seguir 3,5km de trilhas, com possíveis ataques de cobras urutus e descalço, ou então seguir 6,5km de asfalto, com carros passando a toda velocidade ao meu lado? 
    Nem demorei muito para pensar e escolhi a trilha, é claro. Além de ser mais perto, tenho essa forte ligação com a natureza. Peguei o galho de árvore que o seu Jair havia me dado e me embrenhei pela mata adentro. A trilha realmente entra em uma mata bem fechada, e, sem os marcos, as coisas ficam mais difíceis. Chega a bater um leve desespero em mim, mas logo em frente encontro um cara trabalhando no meio do mato, parece que estava abrindo caminho. Ele me informa que tenho que virar a direita para proseguir na estrada real. Foi sorte a minha, provavelmente iria seguir em frente e não sei aonde iria parar, perdendo um bom tempo até achar o caminho correto. 
    Essa trilha não é difícil de ser percorrida, mas aconselho a quem a deseja seguir, que pense duas vezes e procure se informar antes, se não souber exatamente onde se tem que virar a direita. 
    Não encontrei nenhuma cobra pelo caminho, mas dizem que ela é muito perigosa, e ainda estava descalço, para complicar as coisas.

    Terminada a trilha, sigo a BR052, que é boa de se andar, pois tem um bom acostamento. Só é preciso tomar cuidado nas curvas, pois alguns motoristas passam "voando" e não respeitam o acostamento. 
   No céu, pela segunda vez no dia, um helicóptero sobrevoa a  região. Na minha paranoica cabeça, são pessoas que estão monitorando a minha entrada em terras paulistas. 
    Estava bem fisicamente, sem dores e caminhando com boa velocidade. Mas, de repente, o céu começou a ficar um pouco mais cinzento e a temida chuva começou a cair sem piedade nenhuma aqui do mineiro. Abro a barraca e me protejo do jeito que posso. Até que dá para continuar a caminhar sem me molhar muito, mas o pior de tudo é o frio misturado com a água que cai sem parar. São duas horas da tarde e sigo até Vila do Embau sem parar, para não esfriar o corpo e também é complicado descansar debaixo de água. Com mais duas horas de caminhada, em estradas de terra e asfalto, chego finalmente ao destino do dia. Paro em uma mercearia e procuro me informar sobre onde poderia montar a minha barraca e passar a noite. Alguns moradores dizem que não sabem sobre algum lugar coberto, o que me deixa preocupado, pois o vendedor na hora foi sincero ao falar sobre a barraca, dizendo que a mesmo não aguenta fortes chuvas. Estava também fazendo aquelas perguntas para saber como é o povo paulista, se são atenciosos, receptíveis,etc. Depois de muito perguntar, um morador me indica o ponto de ônibus do distrito.
    Espero a chuva dar uma trégua e vou ao local que me indicaram. O ponto de ônibus é bem amplo, é dá para montar a barraca sem problemas com a chuva. O dia está fechado, às cinco e meia da tarde tudo já está escuro em Vila do Embau. Espero que amanhã o tempo melhore. É a segunda vez que chove durante o caminho, que, para mim, é pior do que o sol forte e o frio. Estou muito ansioso sobre essa minha primeira noite em São Paulo, sinceramente não sei como será a receptividade dos paulistas. Creio que terei muita dificuldade de pegar no sono.
foto tirada às cinco e meia em Vila do Embau


sexta-feira, 14 de junho de 2013

Estrada Real: 19º dia


26 de maio de 2013- domingo
Itanhandu-Passa Quatro

    O local que havia escolhido para montar a barraca parecia ser bem tranquilo. Parecia e era, até por volta das dez horas da noite. 
    Perto da igreja matriz, foram montadas, com certa antecedência, as barracas para a festa junina da cidade. Conversei então com os donos de restaurantes que ficavam próximos as barracas e eles não colocaram nenhum impecilho para que eu passasse a noite naquele lugar. Não havia muito movimento, e o melhor, iria dormir em um local coberto e cercado, só quem passava ao lado da barraca da festa é que poderia ver a minha humilde residência. 
    Mas, aos poucos, alguns sons começaram a me deixar meio cabreiro. Primeiro, o abrir de portas de bares. Depois, as músicas. Algumas vozes começaram  a aparecer e, em pouco tempo, se transformou em um alto burburinho que não dava mais para identificar o que estava sendo falado. Nem sai da minha barraca, mas devia ter, pelo menos umas duzentas pessoas em volta de minha barraca. Simplesmente eu estava no point de encontro da galera de Itanhandu. 
    De repente, ouço uma voz nas caixas de som do bar:
    - Alô! Um, dois, teste. Som...
    Depois, regularam o som do violão e o cara começou a tocar. Repertório muito bom, Zeca Baleiro, Engenheiros do Hawai, etc. Mas o cara cantava mal pra caramba. Como já havia tomado o meu pan de cada dia, resolvi continuar deitado e curtir o som. "Lá pelas três horas todo mundo já deve ter ido embora e vai dar para descansar um pouco", pensei.
    Dava para ouvir também a transmissão do UFC em um outro bar. Era uma enorme confusão de sons, mas, como já havia trabalhado como operador de som, estava acostumado com aquilo e até que consegui descansar um pouco. Aos poucos, o clima do UFC parece ter tomado conta dos frequentadores do local. Vez ou outra, surgia um princípio de briga, dispersados sempre pela "turma do deixa disso". Mas, a uma certa altura, não teve jeito: uma briga generalizada tomou conta do lugar. Copos quebrando, as meninas gritando, os caras xingando. Não demorou muito para a polícia chegar e botar ordem lugar. Deu até para ouvir o som do disparo da arma de choque contra um cara. Deve ser muito ruim levar um choque desse, pois, pelo grito que o cara deu, deve doer um bocado. Continuei dentro de minha barraca, como se nada estivesse acontecendo, vai que um dos guardas cisma comigo e ai começa com as perguntas de praxe, que até já decorei. Aos poucos, a calma voltou a reinar e a galera foi embora. Deu para descansar um pouquinho e tirar um cochilo.

caminho muito legal de se percorrer
     O domingo não poderia ter começado melhor: uma bela manhã de sol, mas com muito frio. Sai andando pela cidade à procura de uma padaria de meia e chinelo, para não congelar os dedos dos pés. O ferimento do dedão ainda não estava 100% cicatrizado. 
   Apesar de estar mais ou menos próximo do final, ainda não estou com aquele ânimo que pensava que teria quando chegasse essa etapa do percurso. O verdadeiro dia da preguiça, para mim, é o domingo, não dá vontade de fazer absolutamente nada. 
    Por falar em preguiça, caminhei apenas 13km até a charmosa cidade de Passa Quatro. Não sei por que, mas não encontrei vários marcos no início do caminho. Mas esse caminho até que não tem muitos segredos, é só ir margeando a ferrovia desativada, e ainda tem muitas casas no caminho, para tirar nossas dúvidas.
a pink tomando um bronze...
    Cheguei em Passa Quatro por volta das onze horas e consegui achar um restaurante perto da pracinha, que deve ser o centro da cidade. Como o próximo destino é a 33km de distância, passo o domingo dormindo na pracinha de Passa Quatro. Foi difícil descansar, pois no sol se sentia muito calor, e na sombra, muito frio. Mas a cidade é bem tranquila. O comércio estava praticamente todo fechado. Além do restaurante, apenas uma loja de doces e uma de artesanato estavam abertas nas proximidades. A maria fumaça também funcionava sem parar, mas com poucas pessoas. Somente quando um grupo do Rio de Janeiro apareceu em um ônibus, é que ela teve uma boa ocupação.
a simpática cidade de Passa Quatro
    A tarde começava a cair e então ligo o meu companheiro das horas de solidão: o celular. Estou tentando conseguir o ânimo para prosseguir, tirar forças de algum lugar. Estou bem fisicamente, mas estou um pouco receoso. A próxima parada já é em terras paulistas, e confesso que estou com um pouco de medo. Não conheço nada de São Paulo, a não ser a cidade de Ribeirão Preto, quando fui a trabalho, há muitos anos atrás. Não sei se os paulistas serão tão hospitaleiros e amigáveis como os mineiros foram nesta viagem. Estou há cerca de vinte quilômetros da divisa com São Paulo. Me pergunto se uma pequena distância como essa pode influenciar o modo de ser das pessoas, a cultura, o modo de falar. Passo a tarde inteira refletindo sobre essas coisas, como as fronteiras estaduais foram criadas, por que cada estado tem a sua maneira de falar, etc. A tarde foi meio melancólica, meio triste mesmo, cheio de dúvidas para entrar ou não em São Paulo. Para avacalhar tudo, o meu amigo celular toca "Evebody Hurts", do The Corrs. É uma musiquinha bem melancólica, mas acho legal ouvir em certos momentos. Estava meio que sofrendo, com minhas dúvidas sobre o caminho, principalmente sobre como seria andar em terras paulistas. 
    O meu domingo foi assim, cheio de preguiça e reflexões. Já estava começando a ficar preocupado com o frio da madrugada, pois não havia conseguido nenhum pedaço de papelão para me aquecer. Um hippie apareceu e me disse que havia um albergue em Passa Quatro, que era só se identificar no posto policial e pegar uma ficha. Não poderia ter recebido notícia melhor naquele momento, parece que Deus, às vezes, nos presenteia com esses momentos, para nos dá forças para proseguir o caminho.



    - Música: Everybody hurts
    - Artista: The Corrs

Todo Mundo Se Machuca

Quando seu dia é longo... E a noite
E a noite é solitariamente sua
Quando você está certo de que já teve o suficiente... dessa vida, bem segura ai

Não se deixe ir
Porque todo mundo chora...
E todo mundo se machuca... Às vezes

Às vezes tudo está errado
Agora é hora de cantar sozinha
Quando seu dia é uma noite (Aguente, aguente)
Se você se sentir deixado pra lá (Aguente)
Se você pensa que já teve demais...dessa vida, bem segura ai

Porque todo mundo se machuca... as vezes
Tenha conforto em seus amigos
Todo mundo se machuca

Não solte sua mão. Oh, não.
Não solte sua mão
Se você se sentir como se estivesse sozinho
Não, não, não, você não está sozinho

Se você está sozinho... nesta vida
E se os dias e as noites estão longos
Quando você pensa que já teve demais... segura

Bem, todo mundo se machuca as vezes
Às vezes todo mundo chora
E todo mundo se machuca, Às vezes

E todo mundo se machuca, Às vezes. Então, Segura ai.
Segura, segura, segura, segura

Então aguente firme

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Estrada Real:18º dia


25 de maio de 2013-sábado
Pouso Alto-São Sebastião do Rio Verde- Capivari-Itanhandu

    Pela primeira vez, nesta viagem, não tive ânimo para acordar. Esses dias cinzentos me deixam desanimado. Frio, muito frio, lá fora e dentro da barraca. Adio várias vezes em quinze minutos a hora de me levantar. Choveu a madrugada inteira. Ligo o celular para ouvir um som, mas as músicas, colocadas para tocar no modo aleatório, não ajudam: "A distância", "Os botões da blusa", do Roberto Carlos. São canções que eu gosto muito, caso contrário não estariam no meu celular. Mas não era o melhor momento para ouvi-las. Me dá uma preguiça quando o rei da música canta:
"Chovia lá fora
e a capa pendurada
assistia a tudo
não dizia nada"


      Chuva. Esta ai uma das coisas que eu tenho mais medo em uma viagem a pé, principalmente quando é tão longa como essa. Sabia que iria enfrentar noites frias, dias quentes, poeira, cansaço, dores, etc. Mas chuva, no sul de Minas e nesta época, eu não esperava. 
    O meu celular já está meio avariado, depois que comecei as minhas andanças. Não dá mais para acessar as seleções de músicas que eu fiz, de acordo com o gênero. Como já disse antes, meu celular é uma salada musical(até parece nome de programa de tv) e, nesta manhã, estava precisando de ouvir um bom heavy metal, para me deixar mais elétrico. 
    Planejo então o meu dia: 23km de estrada de terra até Itamonte. Não tive um bom sono. Para falar a verdade, nem dormi esta noite, por causa do frio. A barraca não foi aprovada no teste do frio do sul de Minas Gerais com chuva. Deixou entrar muito frio, apesar de ter conseguido bastante papelão. Sei que, daqui para frente, a tendência é que as temperaturas baixem ainda mais, principalmente a noite. 
    Depois de um bom tempo, crio coragem para me levantar. A chuva deu uma trégua e, quem sabe andando, o frio diminua um pouco. Muita neblina no caminho, e o dia parece que vai seguir nublado. Mas se não chover de novo, já estará de bom tamanho.
muita lama no caminho
     A estrada está com muita lama em alguns pontos. Meu chinelo fica pesado com o barro que fica agarrado na sola, sem contar que, a todo momento ele gruda na lama, quase soltando as tiras. As descidas se tornam muito perigosas, qualquer vacilo é um tombo na certa. 
    Apesar do barro e da lentidão em que estava caminhando, consigo chegar em Capivari pouco antes das onze horas. Almoço em um ótimo restaurante com fogão a lenha. Aos poucos, as nuvens cinzentas foram se dissipando e o sol finalmente apareceu, para minha alegria. No albergue de São Lourenço tinha ouvido que o tempo iria ficar fechado na região até segunda feira. Espero que estejam errados desta vez. 
    Depois do almoço, como sempre, o sono aparece e resolvo descansar em um passeio que está limpo. Ora ficava na sombra, ora ia para o sol. Foi daqueles dias em que sentimos frio na sombra e calor no sol. 
    Estava em dúvidas se iria para Itamonte. A planilha avisa que até hoje não foram colocados os marcos da estrada real naquele trecho(ô pessoal da estrada real, assim não dá!). Pode ser complicado ir a alguma cidade, principalmente em estrada de terra. Se ficarmos perdidos, como faremos se não houver alguma casa por perto?
    Estava me levantando, para sair da sombra e pegar um pouco de sol, quando uma viatura aparece com dois policiais para me abordarem. Já não me surpreendo mais(é a quarta vez nesta viagem) e reajo com naturalidade. Eles fazem as mesmas perguntas de sempre e depois começamos a conversar sobre a estrada real. Eles me aconselham a ir direto para Itanhandu, seguindo uma ferrovia desativada. Dizem que perderia quase um dia indo para Itamonte.
asfalto complicado de caminhar para Itanhandu
     Resolvo seguir o conselho dos policiais, mas vou pela BR mesmo, com receio de me perder na ferrovia, sem os marcos da estrada real. Mas a BR de Capivari a Itanhandu é bem estreita e os ônibus, principalmente, passam na maior velocidade por ela, podendo causar algum acidente com pedestres. Não recomendo a ninguém que siga por essa rodovia.
   Por volta de uma hora da tarde, chego a Itanhandu e constato que a ferrovia segue em paralelo com a rodovia, e que o caminho era bem mais fácil. Encontro um posto de gasolina e consigo tomar um bom banho quente, que me deixa com as energias renovadas.

a simpática cidade de Itanhandu
      Depois, já dentro da cidade, ao passar por uma ponte, ouço alguém gritar o meu nome. Achei aquilo estranho, pois nunca havia passado naquela região antes. Mas, ao olhar para o lado, reconheço os dois policiais que haviam me abordado em Capivari. Me cumprimentam com um largo sorriso. Como mineiro, sinto orgulho de morar no estado que tem uma das melhores(senão a melhor) polícia do Brasil. O viajante da estrada real pode encontrar na PMMG um aliado na caminhada. É até recomendável que tirem suas dúvidas sobre o caminho com os policiais, por conhecerem melhor a região. Mineiro é sempre bom e muito prestativo na hora de dar informações, mas tem horas que alguns exageram nos detalhes, e, se deixar, ficam meia hora para nos explicar tudo. É importante também, ao pedir informações sobre como chegar a um determinado lugar, dizer que você quer seguir pela estrada real, caso contrário, é bem provável que a pessoa, ou até mesmo os policiais, te indiquem o caminho mais usado para se chegar a cidade. A estrada real dá muitas voltas, sai do caminho principal, faz tipo um U, e depois volta ao caminho principal, aumentando e muito a distância entre uma cidade e outra.
    Antes de começar as minhas viagens, eu morava em uma cidade do interior de Minas Gerais chamada Ipatinga. Eu morava em um bom quarto, tinha TV, um bom computador e um frigobar. Mas, nos últimos anos, não estava tendo uma coisa importantíssima e que prezo muito: a paz. O local, aos poucos, foi tomado pelo tráfico de drogas, principalmente o crack, que é um inferno de verdade. Tive que ir embora, depois de oito anos morando naquele lugar. Não tem como ficar batendo de frente com os traficantes, a vizinhança tem medo deles, e eu sozinho não tem como lutar contra aquilo tudo. A verdade é que eu estava mais seguro nas ruas do que ali dentro, cercado de traficantes, ladrões e usuários de crack, que ficam meio paranoicos de tanto usar drogas. Ficam com mania de perseguição também, pensam, por exemplo, que, quando pegamos no telefone, é para chamar a polícia para "caguetá-los". Frequentemente a polícia era obrigada a ir ao local, por causa das brigas e confusões que eles armavam. Teve uma vez que pegou fogo literalmente o lugar, pois um usuário ficou devendo para um traficante, e ai jogaram óleo diesel e botaram fogo no quarto do usuário. Mas sempre que a polícia aparecia ali e me abordavam, era com educação, não tenho nada do que reclamar. Não é babação de ovo, se eles fossem agressivos, eu falaria, como aconteceu uma vez quando estava com a minha barraca montada aqui em Belo Horizonte. Toda regra tem exceção.
    Voltando a viagem, passo um tempo em uma lan house e depois vou para a praça de igreja descansar um pouco e ver como é o local, para escolher um lugar tranquilo para montar a minha barraca. Itanhandu é uma simpática cidade, com ruas limpas e tranquilas, sem muito movimento de carros. Vamos ver como vai ser a noite na cidade, que promete ser bem fria.

tô chegando...


- Um dos posts mais acessados nos últimos dia está sendo o o post especial do dia dos namorados, que eu publiquei ano passado. Foi ai que me toquei que o blog já fez um ano. Obrigado a todos os que o seguem e os que o visitam esporadicamente. Vocês me ajudam a me sentir uma pessoa melhor. Muitos dizem que o que escrevo os ajudaram de alguma forma, mas o comentário é reciproco, podem ter certeza, fico feliz sempre quando vejo os amigos comentando ai nos posts. Passou-se um ano dos dias dos namorados, e o que teria que publicar não seria diferente, pois nada mudou no campo amoroso. Será falta de sorte? Ou por que sou um cara mais reservado mesmo? O importante é que não acho uma obrigação a pessoa ter alguém, claro que isso é muito bom e tudo, mas eu sinto que preciso de ficar só a maior parte do tempo. Mas, não é por que não me dei bem no amor é que não gosto de falar do assunto. Então, feliz dia dos namorados a todos aqueles que têm alguém para dividir suas alegrias e tristezas. Mas, lembrem-se, amem-se a si mesmos antes de tudo. O resto é consequência. Ai vai uma das canções do Yanni que mais gosto. Fazia tempo que nem falava dele né? Havia prometido não falar muito dele, não é por que eu gosto das músicas do cara é que todos irão gostar. Mas, o cara é fera né? Fala a verdade...




      


ETERNO É ESTE AMOR
Este mundo gira tão depressa
Olhares que se cruzam e se vão
As pessoas nem se vêem, não há tempo a perder
Nada dura muito neste plano
Quero ser a imagem que fica
Aquela com quem sonhas a cada anoitecer
Indispensável, única, absoluta
E nenhuma pode te amar tanto assim como eu
Porque eterno é este amor
Se nas noites frias de inverno
Há em seus olhos uma decepção
Só me chame e a seu lado estarei
Cuidando do seu coração
Quero ser a imagem que fica
Aquela com quem sonhas a cada anoitecer
Indispensável, única, absoluta
E nenhuma pode te amar tanto assim como eu
Quero ser a luz sobre seu travesseiro
A cada dia te ver acordar
Fazer interminável cada encontro, perpétuo
Tocaremos até o céu
Porque eterno é este amor
Quero ser a imagem que fica
Aquela com quem sonhas a cada anoitecer
Indispensável, única, absoluta
E nenhuma pode te amar tanto assim como eu
Porque eterno é este amor
Eterno é este amor
Eterno é este amor
Eterno é este amor

terça-feira, 11 de junho de 2013

Estrada Real: 17º dia

24 de maio de 2013
São Lourenço-Pouso Alto

    O albergue de São Lourenço não é muito grande, porém é bem aconchegante, com roupas de cama limpas, chuveiro quente e até uma televisão, apesar de que a única coisa que queria fazer ontem era tomar um bom banho e descansar minhas canelas. Estou numa fase meio sei lá o que, estou pouco ligando para  o que está acontecendo no mundo, se o meu time ganhou ou perdeu, se o papa canonizou mais alguém, etc. 
    Tive mais uma boa noite de sono, apesar de ter que deixar minha mochila em um ármario, bem longe de mim. Eu disse que poderia deixá-la debaixo de minha cama, mas o funcionário do albergue me assegurou que era mais seguro deixá-la trancada no ármario. Estava com receio que ele pudesse fazer uma limpa na minha mochila durante a noite: pegar o meu celular(que ainda está funcionando), a câmera, o dinheiro, etc. De manhã, conferi tudo, mesmo sabendo que era mais uma das minhas cismas, um pouco fruto de minha mania de perseguição que me persegue. 
    Logo depois do café, fui entrevistado por uma assistente social. Entrevista ao pé da letra mesmo, um bombardeio de perguntas, desde sobre a minha família até quantas vezes eu havia fumado maconha em minha vida(três vezes, descobri que não preciso disso, já nasci meio maluquinho mesmo). Super gente boa ela, me ofereceu toalha, me deu conselhos sobre a viagem, até me ofereceu passagem até Pouso Alto, mas recusei, afirmando que a minha proposta era seguir o caminho a pé. Foi uma das poucas pessoas que não se assustaram quando eu disse que o meu destino era Paraty. Assistente social tem que fazer um pouco de psicologia, eu acho, e geralmente entendem essas coisas da mente humana.

    São Lourenço é uma cidade de porte médio, dizem que tem ótimas atrações turísticas, mas não tenho tempo(e nem money) para visitá-las. Demorei um bom tempo até conseguir sair do município. (desculpem os eventuais erros de português, é que esse pc não tem corretor ortográfico, e eu não fiz curso de letras). 
    Mas, antes de sair de São Lourenço, aconteceu um fato meio engraçado e curioso. Fui ao supermercado comprar frutas e biscoitos, a base de minha alimentação nesta viagem. Deixei a mochila e o colchonete no guarda volumes e, ao caminhar, levei até um pequeno susto: estava tão acostumado a caminhar com os dez quilos nas costas que, ao caminhar sem eles, fiz o esforço como se estivesse carregando o peso, e quase que dei um "salto a distância" de tão leve que eu estava, pois também havia emagrecido cinco quilos desde o início da viagem. Fiquei curtindo essa leveza no supermercado, estava até gostoso de ficar andando.

alguém conhece esse cara?
     Entrei na estrada de terra para Pouso Alto por volta das nove horas da manhã. Estrada boa, com casas bem próximas umas das outras. Falta de água e informação não é problema por lá. Encontrei vários "presepinhos" pelo caminho. Em quase todos eles, havia a figura de um cara tocando violão. Esse cara não me é estranho, acho que, quando era criança, tinha um desses em casa. 


    Estava tudo muito bem, muito bom, até estar faltando cerca de seis quilômetros para se chegar em Pouso Alto. O céu começou a ficar um pouco mais cinzento. Algumas gotas de chuva começaram a cair, mas não me incomodaram muito e prosegui o caminho. Mas, cerca de vinte minutos depois ela veio. A temível chuva. Não era uma chuva torrencial, mas incomodava e muito. Tinha planejado a viagem nesta época do ano principalmente para evitar as chuvas de verão, mas não teve jeito. Tive que usar então o meu kit anti-chuva. O plástico de uma cama de solteiro para cobrir e proteger as coisas dentro da mochila e a barraca, que desenrolada, servia como capa de chuva. 
    A estrada de terra começou a ficar escorregadia e enlameada. Estava caminhando de chinelo, por causa do machucado no dedão do pé esquerdo. Um escorregão ali, com aquele peso todo, e com as mãos ocupadas, seria bem complicado. Tive que caminhar bem lentamente. Para piorar ainda mais as coisas, tinha que subir e depois descer uma enorme serra antes de chegar a Pouso Alto. Toda hora dava uma derrapada, mas não cheguei a levar um tombo. Não estava preparado para a chuva, essa é a verdade. Ficar segurando a barraca é muito desconfortável, tira e muito a minha mobilidade. Até que poderia guardar a barraca, e caminhar molhado, mas essa combinação de chuva e frio não é nada agradável. Uma coisa é uma chuva de verão, em uma praia. Agora, uma chuva no sul de Minas, com o inverno batendo as portas, dá vontade de pegar um ônibus e ir embora. Estava sonhando com um cobertor bem quentinho dentro da minha barraca
igreja matriz de Pouso Alto

um pouquinho de chuva
    Não havia nenhum local coberto para me abrigar e segui o restante do caminho sem parar, chegando a Pouso Alto por volta do meio dia. Essa também é uma das desvantagens da chuva, não tem como parar nas estradas de terra, a não ser que algum morador nos deixe entrar em sua casa para nos deixar descansar um pouco. 
    A primeira coisa que fiz em Pouso Alto foi almoçar. Na estrada real, o viajante que está fazendo o caminho, principalmente a pé, não pode perder a oportunidade de almoçar no horário adequado. 
    Depois do almoço, acho um estádio de futebol e consigo tomar um bom banho quente. Converso depois com uma assistente social e fico sabendo que na cidade não tem um albergue. Pergunto se dá para dormir no ginásio de esportes da cidade, mas ela me diz que um morador de rua já frequenta o local.
    Está fazendo muito frio na cidade. Não encontro nenhum local melhor do que o coreto para montar a minha barraca. Não estava contando com essa chuva, ainda mais no sul de Minas. O jeito é arrumar o máximo de papelão que puder e rezar para que a noite não seja ainda mais fria do que o dia, e que a chuva dê uma trégua, para que eu possa continuar a caminhada. Se essa chuva continuar, não sei o que fazer, não estou equipado para caminhar na chuva, ainda mais agora, que estou com o pé machucado. O jeito é rezar muito mesmo.

sábado, 8 de junho de 2013

Estrada Real: 16º dia

23 de maio de 2013-quinta feira
Caxambu-São Lourenço

    Assim como o dia, a noite de ontem também foi das melhores!
    Depois de escrever o post do dia, resolvo dormir no ponto de táxi, ao lado da rodoviária de Caxambu. Na verdade o espaço faz parte da rodoviária, só que não é mais utilizado. Descartei a ideia de dormir ao lado do velório, vai que tem alma penada de alguém que não foi bonzinho o suficiente para ir para o céu e neum mauzinho para ir esquentar lá na casa do tinhoso.
    Chegando lá, encontro algumas pessoas que já utilizam o local para dormir. Um malabarista, que ganha o seu dinheiro nos sinais de trânsito, um skatista e um sergipano, que já está dormindo em alguns pedaços de papelão. 
    Nos cumprimentamos e começamos a conversar. Falamos como viemos parar nas ruas, sobre lugares legais que conhecemos e vários outros assuntos. Tomamos um garrafão de vinho(quer dizer, eles tomaram, eu já fiquei meio alegre no segundo copo e parei). Felizmente, até hoje, eu não aprendi a beber(e nem quero aprender!). Sempre dava vexames e no outro dia não me lembrava de nada, ficando sempre assustado com o que os meus amigos diziam: 
    - Eu fiz isso?
    Por volta das onze horas, fui dormir. Começou a chover forte, e fiquei um pouco preocupado se iria chover de dia também, mas logo peguei no sono. Foi uma das melhores noites que já tive nessa viagem. 
    Acordo por volta das seis e meia, bem disposto e animado para continuar a caminhada. Me despeço meio triste do malabarista e desejo-lhe toda a sorte do mundo. Ontem, cheguei a pensar em andar com ele e o skatista por esse Brasil afora, mas não cheguei a falar isso com eles. Gosto mais da natureza e ele precisa mais das cidades movimentadas, para ganhar o seu sustento nos sinais de trânsito. 
    De manhã, tentei visitar o parque das águas de Caxambu, que parece ser muito bonito. Mas desisto da ideia ao saber que a entrada custa cinco reais. Deu para ver, do lado de fora, que tem um teleférico que leva a pessoa do parque até a montanha onde fica um mini Cristo Redentor, que deve ter uns dez metros de altura. Deve ser um passeio bem legal, para quem não tem medo de altura. Acho que o teleférico só funciona aos sábados, domingos e feriados.
 

parque das águas de Caxambu
       O caminho para São Lourenço também é gostoso de se percorrer, só estava um pouco emlameado por causa da chuva da madrugada. O final do percurso é um pouco puxado, por causa da serra. Acho que dá para evitar essa forte subida, quando dá para se avistar a BR, mais ou menos depois do marco 1126. Mas, como eu gosto desse contato com a natureza, nem pensei em seguir pelo asfalto. 
    O silêncio é tão "alto" que, em um determinado ponto do percurso, deu para ouvir o bater de asas de um gavião voando pelo céu. Nesse momento, me lembrei do decalque do corcel bege, que vi quando criança e tinha a seguinte frase, que nunca saiu de minha cabeça:
    - Mi sonho és ser libre como el pássaro.
    Acho que, em parte, estou concretizando esse sonho. Não posso sair voando por ai como um pássaro, mas tenho a liberdade de ir e vir, sem me preocupar com horários e outras coisas mais. Tenho a liberdade de ser quem eu sou, independente da opinião alheia. Essa é a melhor liberdade que um ser humano pode ter: a de ser ele mesmo.

    A dor na canela esquerda, que de manhã havia desaparecido, voltou na parte da tarde. Acho que vou ter que conviver com ela até o final da viagem. O melhor remédio para dores musculares é o repouso, não tem jeito. Injeção é só mesmo um paliativo.
    Não gosto de ficar olhando quanto ainda falta para terminar a caminhada. Isso me desanima um pouco. O máximo que faço é planejar os dois próximos dias: as distâncias, se a estrada está em boas condições, se tem lugar para almoçar, etc. Assim também é a vida: temos que nos preocupar com o amanhã, é claro, mas não podemos viver o presente em função do futuro. 
    Depois de muito esforço para subir a trilha, chego finalmente a São Lourenço, por volta das duas horas da tarde. Não entrada da cidade, ouço dois caras comentando:
    -Esse "trilha" é muito louco!
    Achei engraçado e fiz sinal de positivo para eles. Não uso um visual extravagante, só bermuda e uma camisa leve mesmo. Acho que tenho cara de maluco mesmo, só pode.
parece com a caveira do Iron Maiden
 
se parece com o que?
     No centro de São Lourenço, que parece ser bem maior do que Caxambu, um carteiro me diz que na cidade existe um albergue. Acho a ideia ótima, dormir sem nenhuma preocupação e em um bom colchão é muito recomendável em uma caminhada tão longa como essa. 
    Esse foi mais um dia tranquilo, mais uma etapa vencida. Essa parte do trecho está sendo muito zen, muito boa para me recuperar. Pelo que já vi nas planilhas, a parte final da caminhada vai ser um pouco puxada, vamos ver no que vai dar.

qual é a parte da tua estrada no meu caminho...

    Gosto de quase todas as músicas do Zeca Baleiro, mas umas de que gosto mais, é essa: se chama Quase nada. 

De você sei quase nada
Pra onde vai ou porque veio
Nem mesmo sei
Qual é a parte da tua estrada
No meu caminho
Será um atalho
Ou um desvio
Um rio raso
Um passo em falso
Um prato fundo
Pra toda fome
Que há no mundo
Noite alta que revele
Um passeio pela pele
Dia claro madrugada
De nós dois não sei mais nada
De você sei quase nada
Pra onde vai ou porque veio
Nem mesmo sei
Qual é a parte da tua estrada
No meu caminho
Será um atalho
Ou um desvio
Um rio raso
Um passo em falso
Um prato fundo
Pra toda fome
Que há no mundo
Se tudo passa como se explica
O amor que fica nessa parada
Amor que chega sem dar aviso
Não é preciso saber mais nada