quinta-feira, 22 de maio de 2014

Divagações esquizofrênicas

 
    Quatro meses em São Paulo. Foi complicado, mas posso dizer que já estou adaptado. Adaptado sim, mas feliz não. Sinto saudades das coisas de Minas, das padarias, do tradicional pão de queijo, do feijão tropeiro e outros quitutes da culinária mineira.
    Claro que não penso somente em comida. Sinto falta da mineiridade, do jeito simples, de falar e de ser, e da educação e gentileza do povo mineiro. Por exemplo, quando pedimos informações sobre a localização de um determinado lugar, o mineiro só falta desenhar um mapa para ter a certeza de que chegaremos ao destino desejado.
    No início, quando ainda estava no Arsenal da Esperança, na mooca, um certo desespero tomava conta de mim quando saia do abrigo por volta das sete da manhã. Ficava que nem uma barata tonta procurando um lugar tranquilo para ouvir o som do silêncio e às vezes me recuperar de uma noite mal dormida.
   Acabei achando o parque da mooca, que não é bem um parque ecologicamente correto. Lá tem uma subprefeitura, uma biblioteca, um poste da saúde e outras coisas mais. Poucas árvores e poucos pássaros. Muitas pombas nos arredores dos bancos, à espera de uma migalha de biscoito ou de um petisco qualquer. As pombas em São Paulo já viraram uma epidemia, já estão muito habituadas com os seres humanos. Estão muito atrevidas e já não se assustam com qualquer coisa.
    No centro da cidade quase tive uma crise de pânico. Toda aquela agitação, o stress de usar o metrô e correria não me fizeram bem. Sabia que poderia ter uma crise há qualquer momento. Então me lembrei que havia lido em um lugar uma placa com uma seta indicando um certo Parque Dom Pedro. Resolvi tentar achar esse parque que poderia me servir como refúgio. Mas acabei descobrindo que esse nome era dado não especificamente a um local sossegado e com muitas árvores. Parque Dom Pedro é na verdade uma extensão do centro da cidade, onde se situa a rua 25 de março, famosa pelas inúmeras lojas com produtos variados e com preços mais acessíveis.
parque D. Pedro e centro antigo
     Estava sem o "pan nosso de cada dia" . Há muito tempo não precisava de tomar essa medicação durante o dia. A solução que encontrei  foi correr até o metrô e voltar para a mooca. Essa foi por pouco...
    Em relação ao trânsito, passei por alguns perrengues. Estava transitando em Sampa como se estivesse em Belo Horizonte, o que me ocasionou algumas situações um pouco perigosas. O trânsito na capital mineira é agitado, mas nada que se compare ao de São Paulo. O motorista mineiro é mais educado e tranquilo. Já o paulista é um pouco mais estressado e apressado, sendo que alguns tem o costume de não respeitar muito a faixa de pedestre e ainda deixam de "dar a seta" na hora de virarem para a direita ou esquerda. Confesso que cheguei a xingar alguns desses imprudentes de corno quando quase me atropelavam. Os motociclistas então nem se fala. Andam apressados entre os carros em um congestionamento e costumam ultrapassarem o sinal vermelho. Mas, tudo bem, isso é fruto de uma cidade superpopulosa onde existe uma oferta maior de trabalho. Na avenida Radial Leste é preciso tomar cuidado quando estamos no passeio, à espera do sinal fechar para os carros. Certo dia, estava bem na pontinha do passeio, quando quase levei uma "retrovisada" na orelha. Aqueles ônibus enormes que tem uma "sanfona" no meio circulam pela radial bem rentes ao passeio e, como o retrovisor do lado direito do motorista é um pouco afastado do veículo, dá- se a sensação que às vezes o mesmo chega a entrar no passeio.
   O paulista tem suas manias e esquisitices. Parece que não gostam muito de café puro, preferindo a média, que é o famoso café com leite. Então, quando estamos em um estabelecimento e pedimos café, provavelmente o atendente nos servirá café com leite. Então temos que dizer que queremos café puro, e ele vem bem cheio. A maioria dos bares não vendem o cafezinho na xícara, na verdade é um cafezão que nos é servido. Até hoje não me acostumei e na maioria das vezes peço café e às vezes me chega o café com leite.
  Outro hábito paulistano que era estranho para mim: o pão no almoço e no jantar. Certo dia, o cara do restaurante Bom Prato achou ruim quando disse para pegar o pão que ele havia colocado em minha bandeja.
    - Mas você tem que avisar que não quer pão!- reclamou.
    - Eu vou almoçar e não tomar café da manhã!- respondi, em tom de brincadeira.
    São Paulo tem poucos sacolões. As frutas e verduras geralmente são comercializadas em feiras ao ar livre.E, como todos já sabem, as coisas por aqui são um pouco mais caras. São Paulo lidera o ranking das cidades mais caras do país. .
    Mas, apesar disso, pretendo ficar por aqui até agosto, quando finalmente os meus empréstimos com o INSS serão quitados. Não estou dizendo que a capital paulista não seja um bom lugar para se viver, mas para o pacato cidadão aqui não dá. Se eu não tivesse tantas paranoias como a mania de perseguição, por exemplo, poderia aproveitar melhor o lado cultural da cidade.

Tempo esquizofrênico
   Outra coisa que demorei um pouco para me acostumar em São Paulo foi o clima. O mês de janeiro foi o mais quente desde 1943, o que me deixou um pouco perplexo. "Cadê a famosa garoa paulistana?", cheguei a me perguntar algumas vezes. Quase não choveu neste verão e o nível do reservatório cantareira, que abastece várias regiões da cidade, já está próximo dos 10%.
    Mas, depois desse quase inóspito verão, o frio aos poucos começou a dar as suas caras. Certo dia, estava no Arsenal da Esperança ouvindo um jogo de futebol pelo celular(apesar do nível do futebol brasileiro estar péssimo, ainda tenho esse hábito, pelo simples motivo de não ter outra coisa para se fazer).
O tempo estava nublado, às vezes um tímido sol aparecia entre as nuvens. Mas no estádio do Morumbi o jogo teve que ser paralisado devido a uma forte chuva de granizo. "Será que essa chuva está vindo para cá?" me perguntei, com medo. Mas o dia foi virando  noite e nem chegou a chuviscar no bairro da mooca.

 
      E diversas vezes cheguei a ouvir pelo rádio que o trânsito estava caótico devido as fortes chuvas que caiam em determinadas regiões da cidade. Mas na mooca nem garoa tinha. Em Belo Horizonte, quando chove é na cidade inteira na maioria das vezes.
    Para sair de casa na parte da manhã é um dilema. O que devemos usar? Nem sempre devemos nos basear pelo tempo que está se fazendo pela manhã. Quase não acerto em minhas previsões e não é raro passar frio o dia inteiro quando avisto um céu limpo no raiar do dia. O inverso também acontece, e tenho que ficar o dia carregando uma blusa de frio quando avisto um tempo fechado pela janela do abrigo.
   O vento também é um fator importante. Não podemos confiar muito nos vários termômetros espalhados pela cidade. Podemos sentir frio ou não com uma temperatura de 22°C. Se estiver ventando, a blusa é necessária. O vento paulista é gelado e cortante. Mas, se não estiver ventando nos sentiremos confortáveis com uma simples blusa de mangas curtas.
    Já estou pensando em comprar uma mochila pequena  para carregar o kit contra as intempéries do clima em São Paulo: capa de chuva, guarda chuva(não vale a bengala de seis reais, tem que ser dos bons, para aguentar uma possível chuva de granizo). Também levarei blusa de frio, protetor solar, boné, etc. Ah! Uma toca é bem vinda, se você tem as orelhas frientas. Cortei o meu cabelo e agora estou sentindo um frio danado nas minhas orelhas. O cara que cortou o meu cabelo é boliviano, e acho que houve um ruído na comunicação, por causa do idioma. Pedi para que ele tirasse só um pouco, mas o cara não teve dó. Mas cabelo cresce rápido né? Deixa para lá.
    Assim é São Paulo. Não é uma cidade linda por natureza, mas tem os seus encantos. É um paraíso cultural. Um paraíso cultural em um inferno urbano, essa foi a melhor definição que encontrei. Acho que teria gostado de conhecê-la antes dos meus surtos, quando conseguia ir a um show sem que as paranoias me tirassem o prazer de se escutar uma boa música. Senti que o meu caso era grave quando, certo dia, deixei de sentir prazer em comer uma pizza quatro queijos em um shopping de Ipatinga, pelo simples fato de pensar que estava sendo observado.
  Assim é São Paulo, assim é o Brasil. Com seus costumes, manias e esquisitices peculiares de cada cidade e região. Tem para todos os gostos e personalidades.
  Bem, agora vou me despedindo, vou tomar um cafezinho, ou melhor dizendo um cafézão puro.
   Até o próximo post pessoal.


4 comentários:

  1. Gostei muito do seu relato sobre são paulo, ela é esquizofrênica também, afinal todos re-conhecemos esse estado de coisas. Apesar de dizer que não é um lugar para um pacato cidadão, você se virou bem na cidade e aprendeu sua linguagem.

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    1. Obrigado pela participação. Não quis dizer que não é uma cidade que não é legal para se viver, cada um tem o seu ritmo, há quem goste dessa loucura toda, a cidade tem os seus encantos, a sensação que se dá é que estamos no centro geográfico do país também.

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  2. Seu blog é demais, com uma escrita muito boa de se ler. Por favor, continue nos presenteando com esses textos maravilhosos. Um grande Abraço e muito Obrigado por compartilhar suas experiências e vivências conosco.

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  3. Eu que agradeço a visita ao blog. Enquanto tiver algum assunto, por mais banal que seja, continuarei a escrever, que é uma forma de terapia para mim. Abraços

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