quarta-feira, 30 de julho de 2014

Livro Mente dividida: revisão

 
    Há cerca de dois anos atrás resolvi, a pedido de amigos, registrar em um livro a minha relação com a esquizofrenia.
    Na internet, quando contava a minha história para meus amigos virtuais, quase sempre ouvia comentários de admiração e algumas pessoas me diziam que essa história poderia resultar em um bom livro. Também comentavam que foi uma história um pouco diferente das que acontecem com a maioria dos portadores de esquizofrenia.
     Logo após o livro, resolvi criar o blog. Após dois anos e mais de 150 postagens, cheguei à conclusão de que havia adquirido uma melhor compreensão do transtorno, além de conseguir expor melhor os meus pensamentos em uma folha de caderno, já que não consigo criar nada diretamente nos teclados.
    Então, após uma breve análise, decidi que era a hora de se fazer uma revisão no livro, além de fazer algumas correções. Confesso que fui um pouco precipitado e apressado para acabar de escrever a obra.
    Faltava algumas vírgulas, pontos, e tirar algumas palavras que foram repetidas em demasia. Enfim, havia um número expressivo de erros. Mas a história é a mesma, não a mudei em nada. a narrativa não foi baseada em fatos reais, pois tudo o que escrevi foram os próprios fatos reais, sem tirar e nem por nada. Não tem nada de ficção, pois os acontecimentos foram tão estranhos que não precisava acrescentar e nem inventar nada.
     Então, quem já comprou o livro não precisa comprar esta revisão. Apenas fiz algumas correções e coloquei de uma forma mais clara e objetiva como os surtos aconteceram, o que não foi uma tarefa fácil. Tinha que narrar de forma organizada uma história muito confusa.
O livro não é um manual de como se lidar com a esquizofrenia, e nem uma tentativa de se encontrar uma solução para esse problema que acomete cerca de 1% da população mundial.
    O livro é a narrativa da minha relação com a esquizofrenia, desde a infância até o momento em que me aposentei, aos 40 anos de idade. A maior parte é dedicada aos surtos, pois, como já disse, foi uma história um pouco diferente da maioria, e também achei interessante contar como a solidariedade das pessoas me ajudou a reverter o quadro.
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o livro recebeu muitos comentários positivos, apesar de não ser um escritor
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    O livro é no formato PDF, tem 127 páginas e o preço é nove reais. Para maiores informações sobre como adquirir o livro, basta enviar um email, com o assunto "livro", para:
juliocesar-555@hotmail.com
    Sei que algumas pessoas não gostam do livro no formato PDF, mas o livro digital tem inúmeras vantagens, como:
-é mais barato
-não ocupa espaço
-não estraga e nem envelhece
- dá para configurar o programa(adobe reader) para abrir o livro na última página exibida, quem não souber configurar, abaixo explico como proceder:
-obs: é preciso abrir o modo de tela cheia para visualizar melhor o vídeo.




     Enfim, resolvi escrever o livro não com objetivos didáticos e sim para mostrar uma história em que a solidariedade foi o melhor remédio para combater e enfrentar algo que ainda é um mistério para a medicina.
    Também gostaria de contar com a ajuda de todos os leitores, se puderem me ajudar com a aquisição do livro estarão me ajudando e muito. Como disse no penúltimo post, quase fui assaltado em São Paulo. Desejo voltar para Belo Horizonte e alugar um quarto para morar. Os meus empréstimos já estão quase quitados, falta apenas comprar algumas coisas e voltar a ter um cantinho para ficar. Morar em albergues é um pouco complicado, e, sempre gostei de morar sozinho. Não estou pedindo dinheiro, apenas que comprem o livro que escrevi e que acredito que o resultado foi satisfatório.

sábado, 19 de julho de 2014

Vivendo e aprendendo... a ser assaltado?


     Finalmente consegui dar um tempo na comilança, e consegui juntar uma grana para realizar a primeira etapa do meu projeto: comprar um notebook.
    Queria fazer isso somente quando estivesse na minha terrinha, no mais Belo Horizonte do Brasil. São Paulo ainda não é uma cidade totalmente conhecida para mim e por isso tenho o receio de ficar andando por ai com uma mochila para notebooks. E, além disso, a minha exacerbada desconfiança de tudo e de todos me impedia de deixar o produto no bagageiro do albergue em que estou no momento. "Se alguém tentar roubar o meu notebook, terá que passar por cima de mim primeiro!" pensei.
    Mas, certo dia, ao passar pela rua Santa Ifigênia, não resisti ao me deparar com um notebook em uma loja de produtos para informática. O note era o que eu queria, nem muito fraco e nem com configurações poderosas, para rodar os jogos mais modernos. O produto era seminovo, estava em um ótimo estado, o preço estava bom, e o cara me deixou testa-lo por mais de uma hora. Não tive dúvidas, saquei na hora a grana no caixa eletrônico mais próximo. Apressadamente comprei uma mochila para o note e passei a andar segurando na alça, olhando para todos os lados e para trás, para ver se alguém estava me seguindo. Agora entendo o porquê de muitas mulheres fazerem o mesmo. Sempre achava que elas estavam com o medo específico de minha pessoa, era como se estivessem me chamando de ladrão.Eu ficava muito chateado com essa situação, cheguei a pensar  em comprar um terno para ver se paravam com isso. Hoje, quando cruzo com uma mulher segurando a alça da bolsa, é como se estivessem me dizendo: "Bem vindo ao clube dos paranoicos de andar pelas ruas do centro de São Paulo..."
    Já na praça da Sé, não resisti. Abri a mochila, liguei o note e acessei o wi fi da prefeitura, apesar de saber que o local é um pouco perigoso e é próximo do parque Dom Pedro, um reduto de usuários de crack. É a primeira vez que adquiro um note, e tudo é novidade para mim, e não reparava nada em minha volta, até a bateria acabar. Não cansava de abrir e fechar programas, ver fotos, até me acostumar com a sensibilidade do local que é usado no lugar do mouse.
    Na chegada ao albergue, apesar de achar um pouco imprudente, liguei o note na tomada e comecei a organizar as fotos que guardo no pen drive. Alguns albergados paravam, olhavam curiosos e alguns me perguntavam o preço do aparelho. Na minha cabeça eles já estavam calculando  o valor do produto do futuro furto. A verdade é que nos albergues grande parte das pessoas são honestas, que trabalham ou que estão procurando emprego. Outros estão lá por algum motivo específico, uma dificuldade passageira. Mas sempre têm aqueles que não querem nada com trabalho, e vivem pulando de albergue em albergue, praticando pequenos furtos, talvez para sustentarem um provável vício em drogas ou álcool.
    Mas, como disse, grande parte trabalha, já encontrei alguns caras do albergue distribuindo panfletos nos sinais de trânsito, ou melhor, no farol, como dizem os paulistanos. Mas, por causa da minoria que não gosta de trabalhar, tive que amarrar o notebook no beliche na hora de dormir. A noite foi complicada, e acho que não dormi em nenhum momento, pelo menos foi essa a sensação que tive às cinco horas da manhã no dia seguinte, quando o monitor acendeu as lâmpadas dos quartos.
    -É, vou ter que ficar grudado com o note até chegar em Belo Horizonte...'- imaginei.
a FIFA até cogitou em proibir as baianas de venderem o acarajé nas proximidades da Fonte Nova

    Tive que deixar de correr e me exercitar no parque Belém. Não podia dar mole, e também estava acordando indisposto pelas noites mal dormidas.
    Na lan house tiro um print com os pontos de wi fi da cidade de São Paulo. O site da prefeitura sobre este assunto está fora do ar, por causa das eleições, e acessei então um outro site, que não me lembro o nome no momento. Haviam muitos pontos, para minha surpresa. Seguindo então o que estava indicado, fui até à uma praça no bairro Belém, mas não encontrei nenhum sinal por lá da prefeitura. Então fui até o ponto mais próximo, no Brás. Era feriado em São Paulo, e o bairro, tradicionalmente agitado em virtude do comércio de roupas, estava muito tranquilo. Alguns bares abertos, uma loja do Ponto Frio mostrando suas mercadorias e poucos moradores de rua estavam sentados nos bancos da praça do Largo da Concórdia. Então abri a mochila e liguei o notebook, mas novamente não encontrei nenhum sinal wi fi da prefeitura. Havia um sinal forte, mas que pedia uma senha. Era de uma lanchonete, e eu, distraidamente comecei a andar com a intenção de achar o estabelecimento, para tomar um lanche e acessar a internet, é claro. De repente, ouvi a palavra, que, só de lembrar, me dá uma tristeza enorme:
    - Perdeu!!!
    Foi tudo muito rápido. Acho que eram três caras. Me lembro que fui derrubado e então segurei o note com todas as minhas forças. Enquanto um cara tentava toma-lo de mim, os outros me davam fortes chutes na cabeça, próximos as têmporas . Se eu tentasse reagir, revidando a agressão, provavelmente iria perder o note, afinal estava com as duas mãos ocupadas, segurando o aparelho que me custou tão caro.
    Então a solução foi me fechar como um tatu e aguentar os chutes, à espera de uma quase improvável chegada da polícia, apesar de haver uma cabine dos homens da lei, à cerca de 70 metros do local. Haviam poucas pessoas nas ruas, a maioria estava no bar tomando cerveja. Alguns haitianos ou nigerianos vendiam fones de ouvido e outras coisas em cima de improvisadas caixas de madeira. Os chutes doíam um bocado, mas no momento só pensava no esforço que fiz para realizar parte do meu sonho de consumo, e então iria segurar o note até que minhas forças fossem embora.
   Era dia de jogo da copa, no Itaquerão. Os corinthianos preferem que chamemos o estádio de arena Corinthians, mas o que tem de mal nisso, para quem incentiva o time aos gritos de "vai curintia"?
   Como quase todo o efetivo da polícia militar deveria estar dando segurança para os gringos, desisti de esperar a ajuda dos homens da lei. Só para se ter uma ideia, a radial leste, uma avenida que liga o centro da cidade ao estádio, é toda monitorada. Dizem que ninguém pode ficar na avenida de bobeira, todos são abordados e aconselhados a se retirarem, para evitar um possível atentado ou coisa parecida com as delegações das seleções que jogaram em Sampa.
    Então continuei resistindo até que um senhor de idade apareceu, gritou algo e tirou do bolso um objeto, que parecia ser um celular, e os caras saíram correndo na hora. Será que o senhor tirou do bolso na verdade um revólver? Não sei...
    Então me levantei  e, como estava meio zonzo, me fiz algumas perguntas para constatar se estava tudo bem com a minha caixola:
    - Qual é o seu nome? Em que ano você nasceu? O que você está fazendo em São Paulo?
    Após constatar que todas respostas estavam corretas, cheguei a conclusão de que, apesar das dores, estava tudo em ordem e que não precisaria de ir a um hospital. Comecei a cuspir um pouco de sangue, e, com a língua, conferi se todos os dentes estavam em seus devidos lugares. Também tudo certo, apenas tive uma pequena ferida no lábio inferior. Na queda ralei o joelho e a calça acabou se rasgando. Machuquei também a mão, mas nada de muito grave.
    Um sentimento de alívio então tomou conta de mim. Era como se eu tivesse ganho um notebook de presente. Mas, entrando um pouco na realidade percebi como fui bobo, tolo e ingênuo ao querer usar de qualquer maneira o notebook. Como pode um cara ficar andando em pleno Brás, de um lado para outro, com um notebook aberto à procura de um sinal wi fi? Eu tinha aquela sensação de que essas coisas só acontecem com os outros. Também me sinto protegido por seres superiores, que costumo chamar de anjo da guarda. Já fui roubado diversas vezes, mas essa é a primeira vez em que a violência foi empregada pelos marginais. Nas outras vezes em que fui roubado, não estava presente. Me lembro que, quando trabalhava na cidade em que tive os surtos, fui roubado duas vezes. O ladrão entrou em meu quarto, já que eu morava na firma e roubou uma quantia equivalente a meio salário mínimo. Isso aconteceu duas vezes, e acho que eram dois ladrões diferentes, pois um deles foi "bonzinho", ao não pegar toda a grana que havia no quarto.
    Mas voltando ao assunto violência, os policiais pedem para não reagirmos aos assaltos, ou seja, que entreguemos tudo para esses caras numa boa, sem fazer nada. Então, a única coisa que podemos fazer é o boletim de ocorrência, apenas para bloquear o celular na operadora, pois já sabemos que nada irá ser feito. Em São Paulo, apenas 2% dos casos são esclarecidos. Muito pouco né?
    Então não tive outra opção. Segurei o notebook como se fosse a minha própria vida, como se tivesse defendido um chute perigosíssimo em uma final de campeonato, e que os atacantes adversários estivessem esperando um rebote. Percebi que os ladrões já estavam pensando em desistir do assalto, já que não conseguiam tirar o aparelho de mim. Cansei de ser roubado, nos pedem para ficar calmos em um assalto, mas, e os ladrões? Existe um assalto politicamente correto? Seria menos drástico se o roubo fosse feito com boa educação, se, ao invés de dizer perdeu, o safado dissesse:
    - "Você está sendo roubado, poderia por favor me passar a quantia total que você tem em sua carteira?
    Seria menos drástico se roubassem somente os ricos e poupassem os pobres, que, com enorme dificuldade compram uma televisão LCD? Acho que seria menos drástico sim, mas não sou a favor dessa teoria. Roubo é roubo e pronto. Se uma pessoa tem uma boa situação financeira por que ralou para isso, então por que seria correto roubá-la? Já ladrão que rouba de ladrão é outra história...
    Confesso que fiquei feliz por que quase tudo ocorreu bem durante a copa, acho que quase tudo funcionou, menos a seleção. Mas continuo com a mesma opinião, copa do mundo é para quem pode, os problemas no Brasil continuam, nos transportes, na saúde, na segurança e um monte de coisas.
    Quem sabe se os policiais naquele dia estivessem em seus devidos lugares, ao invés de darem segurança  para os gringos, eu não seria assaltado? E ainda vou ter que torcer, por exemplo, para não pegar dengue e ficar quase um dia inteiro no corredor para ser atendido em uma UPA ou hospital. Naquele local onde fui assaltado comumente os policiais fazem uma ronda, mas naquele dia estavam à serviço da FIFA. Essa entidade até cogitou em proibir as baianas de fazerem o seu acarajé, passando esse serviço a uma rede de fast food qualquer. Mas  o povo baiano é arretado, e a fifa teve que voltar atrás nesta decisão. Afinal, o que eu ganhei com a copa? Eu não sou dono de bar, de hotel, de agência de turismo e tampouco fabrico as bugigangas que são compradas pelos torcedores nesta época. A única coisa que ganhei foi uma humilhante derrota em campo, que fez vir à tona o que acontece fora dos gramados no Brasil.

    Será que vou ter que virar um monge budista e seguir o ensinamento de que o o sofrmento é causado pelo desejo? Ou seja, se não queremos nada, não vamos ter nada e assim não teremos mais nenhuma preocupação, teremos enfim a tão sonhada paz. Afinal, quem irá se importar com alguém que não tem nada para ser roubado ou invejado? No primeiro surto que tive, senti algo parecido. Estava nas ruas e a única coisa que tinha era a roupa do corpo. Estava meio fora da realidade, é verdade, mas o fato de não ter nada me dava uma tranquilidade que não me lembro de ter depois de atingir uma certa idade. Não tinha horário para nada, nada para esquentar a minha cabeça. Não queria impressionar ninguém para conseguir um trabalho, quase não me preocupava com comida. Belo Horizonte é uma cidade hospitaleira, e ajuda aos moradores de rua nesta questão até que não falta. Confesso que tenho uma certa saudade desse estado mental que experimentei, mas não da situação em que me encontrava. Me lembro que conseguia dormir tranquilamente na calçada, sem cobertor e nem ao menos um pedaço de papelão. Será que o segredo da vida é esse? O não querer e o não ter?
    E agora que estou um pouco mais paranoico, vou tomar mais remédios? Mas como irei reagir a um próximo assalto, se estarei dopado? Se não fosse o peso da mochila, a questão da higiene, a alimentação, eu viveria eternamente nas minhas andanças pelo interior de Minas Gerais.
Iria conhecer cada cantinho desse estado tão maravilhoso e, principalmente de um povo tão simples e acolhedor. Na minha estrada real, o pão de queijo brota aos montes nas árvores, e as vacas vão ao nosso encontro para nos oferecer o mais puro e delicioso leite que já experimentamos...  


            

Flávio Venturini

Andarilho de luz
 
Uma estrela caiu
E nos desejou
Um amor maior que os andes
Das geleiras azuis
A montanha acordou
E emaranhou
Viajante solitário
Avião e vapor
Lua lua luou
E gravou no céu
O seu disco flutuante
Minha vista nevou
Andarilho de luz
Veio me trazer
Un sendero luminoso
Gavião e condor
Nas trincheiras do sol
Todos os irmãos
Mesma trilha guerrilheira
Violão e cantor
Quem pintou amanhã
Paz de bom pastor
Sentimento quebra gelo
Coração e calor