Pode parecer algo banal, rotineiro, comum, para a maioria das pessoas. Mas no meu caso em particular, não é. Para quem era avesso à tecnologia isso é um grande avanço... Olhava as pessoas digitando com a maior rapidez sem olhar no teclado e ficava admirado como que conseguiam fazer esta "proeza"...
Até os meus 40 anos, nunca havia encostado um dedo sequer em uma tecla de um computador e nunca tive um celular. Era (e ainda sou) social ao extremo, quem quisesse falar comigo que me procurasse onde eu estivesse, geralmente no trabalho ou no meu quarto. Tinha medo de encostar um dedo em uma tecla de computador, com receio de que pudesse estragar o equipamento.
A minha relação com a tecnologia era apenas no trabalho, como operador de som. Por gostar muito de música, era um prazer fuçar nos aparelhos até aprender a usá-los da melhor maneira. Ficava mexendo nos efeitos, achava legal transformar a voz da pessoa na de um robô, por exemplo. Mas detestava equipamentos eletrônicos para uso pessoal. Confesso que ficava surpreso e até admirado quando uma pessoa atendia o celular já dizendo o nome de quem estava do outro lado da linha.
- Como que ele adivinhou quem estava chamando? - me perguntei quando vi pela primeira vez uma pessoa falando o nome de quem estava chamando logo de início.
Mas depois que me aposentei comecei a conhecer um pouco o mundo da tecnologia, por falta de opção mesmo do que fazer. Depois que consegui o auxílio doença, no ano de 2005, fiquei feliz e aliviado de início, pois o contato com outras pessoas passou a ser um fator de stress para mim. Mas, com o passar do tempo, o tédio se instalou em minha vida. Era uma rotina mais do que sem graça, apenas saia de casa para almoçar no restaurante popular da cidade. Só sei fazer ovo cozido e miojo. Ah! E brigadeiro também...
Tinha que dar algum sentido para a minha vida, viver daquele jeito não dava mesmo. E então resolvi me fazer um desafio, que na época realmente era um grande desafio: aprender a usar o computador!
Confesso que fiquei com medo de passar vergonha na sala de aula de informática. A maioria das cadeiras eram ocupadas por alunos jovens, na faixa de vinte anos, alguns com cara de nerd's. Também havia uma grande dúvida em minha mente: queria saber se a esquizofrenia havia afetado a minha capacidade de raciocinar e adquirir novos conhecimentos. Enfim, queria saber se a esquizofrenia havia me "emburrecido" ainda mais.
Mas que nada! Com um pouco de esforço e sacrifício, aprendi a digitar com as duas mãos e sem olhar para o teclado. Entrei na aula de digitação umas cinco aulas atrasado em relação aos demais alunos, mas, ficando no curso na parte da manhã e de tarde, rapidamente alcancei a maioria dos alunos e até terminei os exercícios antes de algumas pessoas. Havia dias que ficava enxergando aquelas estrelinhas (bolinhas brancas) de tanto stress que a aula de digitação me dava. Tínhamos que digitar textos completos em um certo período de tempo. Não podíamos atrasar um segundo sequer...
E depois veio a aula de informática. Muito medo no início, muitos caras novos e com cara de nerd. Eu era o cara mais velho da turma, na época com 40 anos. Logo na primeira aula me destaquei, respondendo à maioria das perguntas que a professora nos fazia. Achava estranho aquele método de dar aulas dela, pois fazia muitas perguntas, talvez para que a aula se tornasse mais dinâmica, chamando a participação dos alunos. No dia das provas os alunos só faltavam brigar para se sentarem ao meu lado, a fim de pegar uma colinha. O diploma daquela escola era bem reconhecido na cidade.
Tirei notas máximas, as questões eram fáceis para quem entendia do assunto, mas para quem era leigo tinha um certo nível de dificuldade, pois era um mundo totalmente desconhecido para mim. Não cheguei a terminar o curso, pois já estava satisfeito comigo mesmo, era capaz de usar um computador e cheguei à conclusão de que a esquizofrenia não havia abalado a minha capacidade de raciocínio e de memorizar. Isso valia mais do que qualquer diploma!
E então, neste último sábado, me fiz um outro desafio, que morria de medo de fazer: formatar um computador! Afinal, não tinha um outro equipamento reserva, e qualquer erro poderia dar em merda e aí teria que pagar uma pessoa para formatar o meu notebook. Depois de assistir algumas vídeo aulas no youtube e consultar o Dr. Google, resolvi fazer o desafio. Sem maiores dificuldades, consegui formatar com sucesso o notebook com o windows 10 e instalar os programas necessários Até que não é difícil, mas várias pessoas relataram na internet que tiveram problemas em fazer esta atualização.
http://www.tudocelular.com/windows/noticias/n58501/windows-10-falhas-atualizacao.html
meu amigo note... ele é CCE mas é meu amigo... |
Meus olhos ficaram vermelhos e ardendo durante a instalação, que durou mais ou menos uma hora, pois sequer pisquei os meus olhos durante o processo. Fiquei tenso e com um pouco de medo. Cheguei a pensar até em comprar um notebook usado para aprender a formatar computadores. Não poderia de jeito nenhum dar problema nesta instalação, o aluguel do meu quarto consome a maior parte do salário e não queria pagar um técnico para fazer este serviço.
E fiquei o final de semana inteiro colado no notebook, conhecendo e testando a novidade da microsoft. Não irei comentar se é bom ou não, se é melhor do que as versões anteriores, pois este não é o intuito do blog. Mas no geral, achei bom e interessante. É uma mistura do windows 7 com o 8, pois a versão 8 não foi muito bem aceita pela maioria dos usuários.
saiu a "última versão final" do windows 10 |
Queria aprender muito mais. Exercitar a mente, aprender coisas novas, fazer cursos... Conviver com as pessoas nas salas de aula é uma ótima terapia. Mas infelizmente em Belo Horizonte os portadores de esquizofrenia não têm direito ao passe livre. Somente os que tem déficit mental incapacitante, e a pessoa não pode ir sozinha na perícia. Oras, se a esquizofrenia leva a pessoa ao isolamento, como iria arrumar uma companhia? Poderia muito bem arrumar alguma pessoa, fingir que era dependente dela, mas não sei mentir desta forma. Até nas perícias do INSS eu ia sozinho e não procurava "dar uma de doido" para conseguir o benefício. Apenas respondia com sinceridade ao que era me perguntado,
Em Ipatinga as coisas eram mais simples, tinha o passe livre e fiz alguns cursos. Meu passe livre em Belo Horizonte foi negado, depois de oito meses de espera.Em São Paulo quem usa os serviços do CAPS tem o direito ao benefício, é só ir com a documentação e o laudo nas subprefeituras. Tenho que arrumar uma alternativa para esta minha vida, fica difícil ser feliz com essa vida que levo, sem fazer nada, o dia inteiro no notebook e na televisão. Os profissionais da saúde mental na capital mineira deveriam repensar esta situação, pois os usuários do serviço só ganham vales transporte para irem aos Cersam's, que são como os Caps em outras cidades. O que frequentei não tinha nada para se fazer, os usuários apenas ficavam o dia inteiro sentados nas cadeiras e poltronas e assistindo televisão. Creio que o tratamento deveria ser algo além da medicação.
Impor limites é um dos piores castigos que podemos dar à nós mesmos...
Parabéns
ResponderExcluirParabéns! Tbm venho aprendendo aos poucos usar um note.
ResponderExcluirObrigado, parece difícil à princípio, mas com o tempo você aprenderá. Só não pode viciar, usar o dia inteiro, como eu faço algumas vezes. Parece que tira a energia da gente, não pensamos mais em fazer nada.
ExcluirAbraços
Parabéns pelas suas conquistas!! E pelo blog. Acabei de conhecer seu blog, através de uma publicação no facebook. Meu filho é esquizofrênico. Peço sua licença para trocarmos idéias, eventualmente. Desejo o melhor pra vc!
ResponderExcluirObrigado. Hoje em dia, depois que aconteceram os surtos, passei a valorizar pequenas coisas e pequenas conquistas. Ter condições financeiras é importante, mas em primeiro lugar aparecem outras coisas que geralmente não valorizamos. Se quiser, pode me add no facebook ou então me enviar emails.Abraços
Excluirmeu irmão tem esquizofrenia ,e gostaria q vc respondesse umas perguntas pra mim.
ResponderExcluirA esquizofrenia tem cura ? Ela é uma doença invisível , ou seja , não é detectada por nenhum exame , apenas pode ser reconhecidas pelos sintomas ,q o paciente apresenta ? Os remédios q os esquizofrênicos toma é pra diminuir a frequência das alucinações ou pra mostrar pra ele ,q as alucinações não são reais , são alucinações?Existe algum número pra tirar dúvidas sobre tal doença?
Por gentileza, responda ! Quero ajudar meu irmão.Tenha compaixão ....bye , bye!
Olá
ExcluirOlha, sinceramente não sei como lhe ajudar, sou apenas um portador de esquizofrenia que resolveu escrever o pouco que sabe sobre o assunto e as vivências que teve ao longo dos anos. Infelizmente a esquizofrenia não tem cura, segundo a medicina. Acho que sim pode haver uma grande melhora, e isso depende principalmente da primeira abordagem, no primeiro surto psicótico. Infelizmente no Brasil o tratamento consiste basicamente em medicamentos antipsicóticos e em doses altas.
Não existe nada comprovado ainda em relação á exames para se detectar a esquizofrenia, pelo menos por enquanto, mas estão sendo estudos sobre o cérebro do portador de esquizofrenia, principalmente se fazendo exames de imagem.
Os medicamentos basicamente nos deixam dopados, sem reação. Ou seja, se diminui os surtos, diminui a vontade de realizar outras atividades. Eles atuam no sistema nervoso central e se por um lado diminuem as paranoias e outros pensamentos, também diminuem coisas positivas que geralmente fazemos. Em relação sobre tirar dúvidas sobre a esquizofrenia, infelizmente os CAPS parecem não se esforçarem para informarem os familiares sobre o que é a esquizofrenia. Não procuram informar nem o paciente e tampouco os familiares. Sugiro que baixe o livro "Entendendo a esquizofrenia" que é direcionada também aos familiares. É só clicar na imagem no lado direito da página, na CDE, "Central de Downloads do Esquizo" Espero ter ajudado.
Obrigado por ter respondido!
ResponderExcluirNa verdade , o irmão q citei é meu irmão gêmeo. Me diga uma coisa : qual a probabilidade de eu ter esquizofrenia?Eu pensei q por ter 24 anos , estava livre , mas quando vi q vc teve o primeiro surto depois dos 30, tremi na base.
Broder , vc teve o primeiro surto muito velho , não?
Olá
ResponderExcluirBem, a esquizofrenia não é somente as crises, os surtos. Me lembro que tive um surto mais ou menos leve por volta dos 29 anos, mas o primeiro surto grave foi aos 32 anos de idade. A medicina ainda não tem a certeza se existe um fator genético para a esquizofrenia, mas, nas minhas conversas com outros portadores, deu para constatar que muitos esquizofrênicos tem pais com algum tipo de transtorno mental. Mas não precisa ficar preocupado tanto assim, procure estudar e informar o máximo sobre o assunto. Sugiro que leia o livro Entendendo a esquizofrenia. No lado direito tem o link para baixá-lo, é só clicar na imagem CDE, Central de Downloads do Esquizo. E também, além de estudar o assunto, tem que tentar conhecer a si mesmo, o que te estressa, o que pode ser o seu ponto fraco, para assim evitar situações que não te farão bem. Espero ter ajudado.
Bom dia!
ResponderExcluirSempre trabalhei em restaurante, até que a vida me deu de presente o trabalho em um colégio de recepcionista, precisava ter habilidade com informática; meu Deus e agora? Fui direto me matricular num curso para não perder esta chance, que vergonha da sala de aula; depois de tanto tempo! Mas enfim era necessário...fazem 5 anos e até hoje fico "catando feijão nas teclas"...Pode me mandar fazer qualquer comida, mas para mexer neste treco de computador...ô negação! Então filho, não se desmereça; vc é brilhante e pode tudo! Tanto porque, não sei bem explicar o que vou dizer: mas acho a mente esquizofrênica de uma inteligência surpreendente, o que falta é a sensibilidade de quem os acompanham (familiares, médicos, psicos, caps, governo) para desenvolver suas habilidades. Nós pobres "normais" é que vivemos enclausurados num mundo de regras impostas...
Verdade, alguns portadores de esquizofrenia tem a inteligência acima da média (não o meu caso) e acho que isso chega até a atrapalhar, o excesso de informações, a vontade de aprender mais e mais. Se não for bem trabalhado isso, pode até atrapalhar. Regras rígidas nunca me atraíram, por isso que acabei trabalhando como operador de som, assim não precisaria de usar tantas máscaras que as pessoas precisam usar em seus trabalhos. Estudei eletrônica, poderia ter seguido outro caminho(está tocando agora a música "maluco beleza" neste momento), mas nada poderia garantir que seria feliz trabalhando em uma indústria de produtos eletrônicos, por exemplo. E seguindo o caminho padrão: casar, ter filhos, e trabalhar em uma empresa e domingo ir ao zoológico dar pipoca aos animais. Engraçado é que estava ouvindo metamorfose ambulante que você colocou o link em um outro comentário, mas quando fui responder este, estava tocando maluco beleza pois deixei continuar rodando os vídeos no youtube.
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