segunda-feira, 31 de março de 2014

Um caso diferente

  
    Conheci Fidelis no ano de 2004. Quando fui levado para o albergue de Ipatinga, ele já estava lá. Não falava muita coisa, vivia em seu mundo, com a mão no queixo como que buscando lembranças de um passado esquecido.
    - O guarda bateu em Fidélis. - era a frase mais usada por ele.
    Devia ter uns 30 anos de idade e ninguém sabia de onde veio. Apareceu pelado em uma rua de Ipatinga e foi levado pela polícia militar para o albergue. Não dava trabalho. Sabia fazer suas necessidades no banheiro. Sabia também a hora de almoçar, jantar e dormir. Só não era muito chegado em tomar banho. Às vezes, quando ficava mais agitado, brincava de capoeira com qualquer pessoa que via no pátio do abrigo. Também soltava umas risadinhas quando ficava com a mão no queixo. Não sou psiquiatra para dizer qual tipo de esquizofrenia ele tinha. Talvez seria catatônico ou hebrefênico, sei lá. Tenho mais noção da esquizofrenia paranoide, que é a que eu tenho e que é a mais comum.
    Até hoje só vi um catatônico em minha vida. Era como se fosse uma estátua, seu olhar era vago, sem nenhuma expressão no rosto, quase não piscava os olhos. Não respondia a nenhum estímulo externo e ficava com uns movimentos repetitivos com os dedos. Talvez o Fidelis seja hebrefênico mesmo, sei lá.
    Bem, antes de continuar a história de Fidelis, me vejo na obrigação de  contar a minha relação com os abrigos. Talvez os leitores possam estar pensando que eu só vivo nesses lugares, que eu sou um "boca de rango# "e tals sahsuahsaushas
pedreira Prado Lopes, Belo Horizonte
   Até antes de surtar pela primeira vez, no ano de 2002, não conhecia e nunca havia pisado em um abrigo. Sai de casa aos 17 anos e trabalhei por 17 anos consecutivos. Na minha primeira crise, pedi demissão do meu emprego e fui parar nas ruas de Belo Horizonte, numa inútil tentativa de fugir dos inimigos que estavam em minha mente. Fiquei fora da realidade por cerca quatro meses, passando por algumas situações perigosas. Assim que me recuperei, tive que apresentar um endereço na hora de tirar novamente todos os meus documentos que havia perdido durante os surtos. E foi então que conheci o albergue "Tia Branca", situado na época na pedreira Prado Lopes, uma das regiões mais perigosas da capital mineira. Além de estar na crackolândia de BH, o albergue estava perto de favelas onde o tráfico de drogas é intenso.
   O abrigo era muito sujo e deprimente. À noite era fornecida uma sopa em um prato de plástico. Certa vez, o bicho pegou na favela. Tiros de metralhadoras ou submetralhadoras eram ouvidos sem parar, sendo que alguns pareciam ter caído bem perto da porta do albergue. Não fiquei lá mais do que três dias,  raramente voltava para checar as correspondências e verificar se o meu cpf havia chegado. Sinceramente dormir nas ruas era mais tranquilo do que naquele lugar.
    Depois só fui conhecer outro abrigo em Ipatinga. Foi durante o meu segundo surto, por volta do ano de 2003.  Tinha que trabalhar com todas aquelas vozes e pensamentos em minha cabeça, e as minhas energias foi aos poucos se dissipando. Não tomava o haldol receitado pelo psiquiatra, não iria conseguir trabalhar dopado daquele jeito, ainda mais de noite, operando uma mesa de som.
    Quando as minhas energias já estavam no fim, comprei um colchonete e várias pilhas para o meu radinho. Era uma sexta feira e, por volta das cinco horas da tarde, deitei-me em frente a agência do INSS. Não queria chamar a atenção, fazer greve de fome, etc. Simplesmente não tinha mais energia para continuar a lutar e deixei tudo nas mãos de Deus. Não iria me alimentar, havia feito a minha última refeição em uma churrascaria da cidade, como se fosse um condenado à morte. Comprei várias pilhas pois queria ir dessa para outra ouvindo música, achava que isso poderia amenizar o meu sofrimento, pois não tinha muita noção do quanto iria viver sem me alimentar. Bem, o resto da sexta feira e o fim de semana foram tranquilos, só tomei um lanche no domingo, pois um cara me ofereceu dez reais. Mas na segunda feira o bicho pegou. Teve polícia e até ambulância, fora o monte de curiosos que paravam para ver o que estava acontecendo.
    - Pensei que ele estava fingindo que estava louco só para se aposentar!- disse uma funcionária do INSS.
    O policial parecia querer me levar, pois estava discutindo com uma assistente social, afirmando que eu estava me drogando com remédios. Realmente eu estava tomando alguns "diazepan's" durante o dia, para não ficar muito agitado.
    No final das contas a assistente social pareceu ter convencido o guarda de que eu era gente boa. Acabei indo de ambulância para um asilo, já que na cidade não havia um albergue.
    Era dezembro. Me lembro bem. Fiquei três dias nesse asilo consertando os piscas- piscas que serviriam para enfeitar o local e a árvore de natal. Era complicado consertar aqueles enfeites, pois, se uma "lampadazinha" queimasse, outras dez paravam de funcionar também. Então, com toda a paciência do mundo, tirei todas as lâmpadas, testei uma por uma, lixei os seus contatos e refiz tudo de novo. Foi uma terapia para mim, assim não daria tanta importância aos meus pensamentos.
   Era um bom asilo, com boas dependências. Haviam muitas enfermeiras, cinco refeições por dia, enfim, os velhinhos eram bem tratados naquele lugar. Fiz amizade com alguns, eles apenas queriam alguém para conversar, serem ouvidos. Havia uma que era cadeirante, mas muito alegre e comunicativa. Uma outra parecia ter transtornos mentais, pois chorava como se fosse uma criança. Um outro vez ou outra soltava uns berros. Tinha um cara que aparentava ter apenas uns 50 anos, seus cabelos ainda não estavam embranquecidos, mas não conversava com ninguém. Fiquei pensando o que o levou a morar naquele local.
    Mas eu não podia ficar naquele lugar por muito tempo e então fui levado para o albergue de Ipatinga. O negócio era tenso de noite naquele lugar. Muitas brigas já que qualquer pessoa poderia entrar lá, mesmo estando alcoolizado ou drogado. Grande parte do pessoal já tinha passagem pela polícia. Então tratei de ficar quietinho no meu canto para não sobrar para mim. Só houve problemas mesmo quando fui roubado por um usuário de crack. Chamei a a polícia, mas o guarda, ao chegar ao local, disse que, se houvesse confusão todo mundo iria parar na delegacia. Ou seja, tive que deixar passar batido, e ainda aguentar a zoação do cara e não perder a paciência.
    Mas foi assim que conheci Fidelis, ficando cerca de um ano naquele lugar, me tratando no CLIPS, até conseguir o auxílio doença. O tratamento na área de saúde mental em Ipatinga era muito bom, poderia ficar conversando com o psiquiatra durante meia hora, e isso me ajudou e muito na minha recuperação parcial.
    Me lembro de um certo dia em que eu e o Fidelis fomos juntos ao CLIPS. O psiquiatra me receitou a risperidona e um outro remédio para o Fidelis. Só sei que acordei detonado no dia seguinte, o meu amigo também ficou mal, até parou de falar e dar as suas risadinhas. Provavelmente ele tomou também a risperidona.
    Como havia vomitado no jantar, pensei que o psiquiatra também estava fazendo parte do complô para me matar aos poucos, para não ficar muito evidente de que se trataria de um crime. Parei de tomar e fiquei fingindo, guardando o remédio no canto da boca e depois jogando fora.
    Já o Fidelis continuou tomando, pois as funcionárias conferiam se ele realmente havia engolido o medicamento. Estava apático, e, mesmo passando semanas, ele não teve nenhuma melhora. Não se lembrou de nada, não falou nada.
    Depois de passar na perícia do INSS, aluguei um quarto e fui embora do abrigo. Meses depois, fui visitar os funcionários e, ao perguntar pelo Fidelis, fui informado que ele havia sido transferido para um hospital psiquiátrico. Fiquei triste, afinal ele não era agressivo, não fazia mal a ninguém, ao contrário, divertia o pessoal do abrigo com o seu jeito de ser. Provavelmente deve estar tomando um haldol injetável até hoje ou então um outro sossega leão qualquer. Ou seja, ele foi condenado a passar o resto de sua vida em um hospital simplesmente por não saber quem é e por  apenas dizer:
    - O guarda bateu em Fidelis...
   Será que nesse caso vale a pena medicar uma pessoa? O Fidelis não era agressivo, não fazia mal a ninguém, não teve nenhuma melhora com os remédios. Deixou de sorrir, de falar e de brincar de capoeira.

# boca de rango- indivíduo que é comumente visto em lugares onde há doação de alimentos e roupas. Raramente é visto em locais onde é oferecido trabalho.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Razão x Emoção

 
     No último domingo o compositor e tecladista Yanni tocou aqui em São Paulo. Acho que a maioria dos leitores do blog sabem o quanto admiro esse cara. Suas músicas, as suas parcerias, o estilo musical inconfundível que muitos erroneamente chamam de nova era e que mais erroneamente pensam que é coisa do demo. O estilo de música dele não é new age, é um som diferente, ele é acompanhado por músicos de várias nacionalidades, o que torna o seu som único.
   Além de tudo, o cara é autodidata. Se é complicado aprender música com um bom professor, imagina sozinho! Creio que isso é um dom, que, sem esforço e trabalho não valeria de nada. Hoje ele é acompanhado por uma orquestra e viaja o mundo inteiro para mostrar o seu trabalho. Já gravou na Acrópole(Grécia), no Taj Mahal(Índia) em castelos e em vários lugares exóticos.Já sabia com certa antecedência que ele iria passar por aqui. Achei uma certa coincidência eu estar na mesma cidade, mas não passou disso.
    Domingo estive no ginásio do Ibirapuera. Quem sabe não daria para vê-lo entrar no ginásio para passar o som? ( regular o som para o show). O evento estava marcado para as sete da noite e de tarde lá estava eu, ansioso para ver um cara que admiro muito, mas não idolatro. Havia muitos seguranças e pessoas que iriam trabalhar no evento. Todos de terno preto. Alguns seguranças vez ou outra conversavam pelo radinho. Aos poucos, fui me sentindo desconfortável, pensando que estavam falando de mim, pois não estava vestido à caráter, ou seja, de acordo com o evento. Uma van entra no ginásio e de lá sai um velhinho carregando uma case, provavelmente um instrumento de cordas. Talvez venham passar o som mesmo e vai dar para ouvir um pouco, pensei. De repente chega uma viatura da polícia civil escoltando dois carros pretos. Seria ele? Não sei, foi tudo muito rápido.
    O ingresso mais barato custava 180 reais. Até que tinha a grana. Cheguei a balançar, fui até a bilheteria, quase entreguei o meu cartão para a vendedora, mas na hora resisti. Fiquei com uma dúvida imensa em minha cabeça: talvez seria a minha última oportunidade de vê-lo, acho que não voltará mais ao Brasil, pois já esteve por aqui no ano passado.
   Depois de um embate interno muito intenso, a razão ganhou da emoção e não comprei o ingresso. Também não deu para ouvir os caras ensaiarem, hoje em dia a tecnologia está muito avançada, e dá para se guardar a regulagem da mesa de som em um pen drive. Não tem essa de ficar todo dia passando o som. Fiquei triste, confesso, mas o tempo sara essas feridas. Sei que fiz o correto, nada de loucuras por pessoas que admiramos, mas que não devemos idolatrar.

Yanni na Acrópole, na Grécia

Socorroooooooo!!!!!!!!!




    Em São Paulo a internet gratuita, ou seja, da prefeitura, se chama telecentro. Bem, nas duas bibliotecas do bairro Santana até que consegui acessar a internet normalmente, mesmo na hora do almoço. Na biblioteca principal monitor LCD e um bom pc. Na outra, um pouco menor, os equipamentos são antigos, mas a internet é razoável
    Agora, na biblioteca da Mooca existe um "telecentro" que não dá para classificar. Se falar que a net desse telecentro é ruim, estarei elogiando. De manhã, com muita paciência, dá para acessar os emails e o facebook, e outros sites mais que tenham algumas imagens. Já na parte da tarde...
    Não se dá para acessar o facebook, e, quando conseguimos, depois de cerca de 30 minutos, as imagens não são descarregadas. Não consigo abrir o blog para publicar postagens. Sites com muitas imagens, nem pensar. Com muita paciência dá para se ler alguns emails. Certa tarde, quando havia apenas três usuários no telecentro, resolvi medir a velocidade dessa net lesma da biblioteca. Não acreditei no resultado: 0.02Mbps!
Isso mesmo, pior do que net discada, isso no ano de 2014! Isso é uma brincadeira de mau gosto para quem vai ao local pela primeira vez, pois pensa que o sistema está lento e tals e fica uma hora sem fazer nada.
    E além de tudo,  o banheiro quase sempre fica trancado. Há um aviso que o banheiro foi alvo de vândalos, mas, quando entrei, o mesmo se encontrava em perfeito estado. Notei que apenas algumas pessoas podiam usar esse banheiro, pedindo a chave para uma funcionária da biblioteca.




                                                       





   Na entrada do telecentro existe um cartaz com o telefone para reclamações. Telefonei e me informaram um outro número de telefone, mas que não atendeu nenhuma das minhas várias mensagens. Ou seja, tive que telefonar para o primeiro número para reclamar que o segundo número não atende. Esse é o nosso Brasil!

quinta-feira, 20 de março de 2014

Psicólogas são perfeitas?

 
     Esse depoimento uma psicóloga me enviou nos comentários de um post. Fiquei sensibilizado, pois comprova que os psicólogos(as) e psiquiatras são humanos como nós, os pacientes da saúde mental. Eles têm os seus problemas, suas falhas, suas fraquezas. Eu tinha esse problema de idealizar as pessoas, e sempre sonhava em namorar uma psicóloga. Na minha cabeça ela  seria sempre compreensiva, nunca teria um ataque mesmo com tpm, e, se fossem reclamar de algo, seria com aquela voz suave que comumente usam quando estão no trabalho. Enfim seriam perfeitas. Mas, para a nossa felicidade, a perfeição não existe, e cada um tem a sua maneira de ser e encarar as coisas. Ela me autorizou a postar o seu comentário e o seu nome não é Mônica:

"Ola Júlio, Td bem?
Vc tem uma sensibilidade muito bonita, assim como sua história... e que bom saber que ela não acabou por ter sido sentenciado com um diagnóstico.
Vc já assitiu Clube de Compras Dallas que concorreu esse último Oscar de 2014? No começo do filme, a gente vê um homem escroto. (Matthew McConaughey) sem limites, preconceituso, amoral... até quando é dada a sentença da AIDS (o filme é retratado nos anos 80, portanto a sentença era de morte). O que me chamou atenção no filme, além da interpretação do ator, é a qualidade que todos nós deveríamos ter e não temos, pq. ficamos sentados diante das nossas sentenças. Ele vai a luta com todas as forças que tem...e a história é totalmente real. O prognóstico do tempo de vida dele era de 1 mês e ele conseguiu viver mais 6 anos, pq. não aceitou morrer pela aids. No começo do filme, sua homofobia incomoda, agride, mas depois a gente acaba não se importando com isso, ja que foi através dessa homofobia e por ela que ele se motivou a continuar. No final, ele sucumbi ao preconceito. Te vi assim, corajoso tbm.
Sou psicóloga clínica já algum tempo. Trabalhei em CAPS e tbm com abuso sexual infantil. Sempre me diziam que é muito mais punk, encarar uma criança que sofreu abuso do que um esquizofrênico, bipolar, etc... eu particularmente não acho e também não há como se comparar nada com nada... tive síndrome do pânico por uns bons anos e sei o que é o sofrimento mental, mas o estígma da esquizofrenia é estranho e também preconceituoso. Vejo as pessoas dizerem que pacientes com transtorno mental são agressivos. Outros dizem que "os doentes" não sofrem por que nem tem consciência do que acontece com eles no momento da crise.... oi?? .rs.
Tive um paciente querido que tentava chorar a todo custo...ele realmente precisava "lavar" aquilo que sentia... uma outra paciente me agarrava com toda força pedindo para que as vozes saíssem da cabeça dela, pq. não aguentava mais... eu tbm, assim como ela, desejei muitas vezes que tudo aquilo desaparecesse...mas, penso que o doente sofre muito mais com as pessoas "de fora" do que as que as de dentro. As de dentro são inofensivas...as de fora julgam.
Finalmente, só pra falar que concordo sobre falarmos do diagnóstico para o paciente. É o direito dele como cidadão. As pessoas não tem que andar por ai dizendo que tem depressão, por ignorância e ignorância do profissional que tbm por preconceito (dó ou sei lá o que) não colocou as cartas na mesa. Ah! entrei aqui para tirar uma dúvida pq. to estudando para o concurso de Psicóloga da Prefeitura de SP. "
Abs. Mônica

    Incrível como certas músicas têm muito a haver com a vida da gente. Essa semana achei essa, do Roberto Carlos, que nem sabia que existia. Já tinha ouvido "O portão" mas essa, que se chama "A janela" não tinha ouvido ainda. Nem vou comentar muito, pois a própria letra já fala tudo. Quem nunca teve vontade de sair de casa e sair andando por ai? Pois eu fiz isso e não me arrependo de nada. Mas gostaria de alertar que essa vida não é uma maravilha como muita gente pensa. Tenho que sair carregando uma mochila de 11 kg nas costas, sem contar as noites mal dormidas, as chuvas, o sol forte, a falta de água no caminho. Por isso que digo que é preciso pensar bastante antes de tomar uma decisão dessas.


Da janela o horizonte
A liberdade de uma estrada eu posso ver
O meu pensamento voa livre em sonhos
Pra longe de onde estou
Eu às vezes penso até onde essa estrada
Pode levar alguém
Tanta gente já se arrependeu e eu
Eu vou pensar, eu vou pensar
Quantas vezes eu pensei sair de casa
Mas eu desisti
Pois eu sei lá fora eu não teria
O que eu tenho agora aqui
Meu pai me dá conselhos
Minha mãe vive falando sem saber
Que eu tenho meus problemas
E que às vezes só eu posso resolver
Coisas da vida
Choque de opiniões
Coisas da vida
Coisas da vida
Novamente eu penso ir embora
Viver a vida que eu quiser
Caminhar no mundo enfrentando
Qualquer coisa que vier
Penso andar sem rumo
Pelas ruas, pela noite sem pensar
No que vou dizer em casa
Sem satisfações a darCoisas da vida
Choque de opiniões
Coisas da vida
Coisas da vida
Penso duas vezes me convenço
Que aqui é o meu lugar
Lá fora às vezes chove
E é Quase certo que eu vou querer voltar
A noite é sempre fria
Quando não se tem um teto com amor
E esse amor eu tenho mas me esqueço
Às vezes de lhe dar valor
Coisas da vida
Choque de opiniões
Coisas da vida
Coisas da vida
Tudo tem seu tempo
E uma vida inteira eu tenho pra viver
E nessa vida é necessário a gente
Procurar compreender
Coisas que aborrecem
Muitas vezes acontecem por amor
E esse amor eu tenho esquecido às vezes
De lhe dar valor
Coisas da vida
Choque de opiniões
Coisas da vida
Coisas da vida

segunda-feira, 17 de março de 2014

Um alimento bom para a mente


 Goji Berry
   Tomei conhecimento desta fruta em um jornal que é distribuído gratuitamente no metrô aqui de Sampa. Me chamou a atenção as propriedades deste alimento e os seus nutrientes, que parece estar na moda e ser a próxima tendência desses meses. Primeiro foi a linhaça, depois a quinoa e agora o goji berry. Não é bichice não, mas a única moda que gosto de me informar e seguir é a moda alimentícia, rsrsrs.
   E por que este tema está aqui no blog? Principalmente por contém muita vitamina do complexo B, que, creio que a maioria já sabe, é a vitamina do cérebro. As pessoas viciadas em álcool podem ter alucinações ou até mesmo vir a desenvolver um quadro de esquizofrenia justamente pelo fato do álcool impedir ou diminuir a absorção da vitamina B pelo organismo. Já tomo o ômega 3 que é considerado um bom alimento para a mente. Creio que uma combinação com o goji berry deva ser uma boa no combate a esquizofrenia. Acredito em coincidências, sincronicidade, sei lá o nome. Creio que não foi a toa que esse jornal veio parar em minhas mãos. Claro que não estou incentivando ninguém a abandonar os medicamentos, mas devemos nos informar sobre outras formas de melhorarmos a nossa saúde mental, e, por que não física, já que uma está diretamente relacionada com a outra. E essa fruta auxilia no emagrecimento, o que é uma boa para quem toma os famosos antipsicóticos, que, como todos sabem, costumam dar uma engordada na gente, justamente por agir na área do cérebro responsável pelo apetite. Eis ai o texto na integra: 

    "O goji Berry é uma frutinha originária da China, Tibete e Mongólia, cultivada na região do Himalaia, que age contra o tempo e faz bem ao corpo. Segundo a nutricionista da Clínica Nutrissoma Bárbara Riboldi, é uma fruta rica em aminoácidos, vitaminas, minerais, ácidos graxos insaturados, antioxidantes e polissacarídeos. Por conter essa combinação que propociona benefícios variados á saúde, é considerado um superalimento.
    A fruta asiática é encontrada em três versões: desidratada(que facilita o transporte do oriente até aqui), in natura (a forma mais rara de ser encontrada nos mercados) e na forma de suplementos, em cápsulas ou em pó. De sabor azedo, quanto mais vermelho, mais conservadas estão as propriedades benéficas à saúde.
    De acordo com a nutricionista do emgracimento Fernanda Ferreira Dos Santos, o fruto auxília no emagrecimento devido à alta concentração do complexo B, atuante no metabolismo energético, além de conter cálcio e proteínas, que além da perda da massa gorda, entra na formação de massa muscular. "É também fonte de fibras e contém baixo indíce glicêmico, isto é, libera menos açucar no sangue", explica.

    Vale mais do que uma laranja
    A especialista do emagrecimento destaca também outra substância que faz bem ao organismo: a vitamina C. "Elas estimula colágeno e cicatrização, em quantidade superior ao da laranja. Contém betacaroteno que atua na pele e visão e possui A.G.E, ácidos graxos essenciais que funcionam como antiinflamatório, antioxidante e anti-idade" revela os diversos ganhos que o consumo da frutinha fornece. "Isto significa que além de auxiliar na perda de peso, é considerado um alimento funcional que age no sistema gastrointestinal e imunológico, ajudando na prevenção e tratamento de doenças como: hipertensão, arteriosclerose, câncer, diabetes, hepato e neuroprotetor", esclarece a profissional."

                                                                    Como consumir?
    A nutricionista do emagrecimento orienta consumir de 15 a 45 gramas por dia, in natura, ou desitratada, em sucos naturais, frutas, cereais integrais, iogurtes desnatados e saladas. Ou ainda em cápsulas de 400-600mg. Ela sugere uma receita mix para adicionar aos doces ou salgados:

-um punhado gojiberry
-um punhado de cranberry(pensei que fosse nome de banda de música pop)
-um punhado de uva passa
-um punhado de castanha do Brasil
-um punhado de semente de abóbora

Ômega 3
    Neste post comentei e coloquei um link sobre os benefícios desta gordura do bem para quem tem esquizofrenia. Mas, meses depois, fiquei sabendo que o excesso pode causar problemas também. Logo abaixo tem o link sobre os perigos do excesso do ômega 3. Vale ressaltar que disse excesso, eu tomo 1000mg por dia, e creio que esteja numa faixa aceitável. Pesquisando na internet descobri que 4000mg é considerado excesso, mas ainda há controvérsias sobre qual a dose ideal.
Link sobre os benefícios do ômega:
http://memoriasdeumesquizofrenico.blogspot.com.br/2012/09/omega-3-e-esquizofrenia.html


Link sobre os possiveis maleficios do exagero do ômega3:
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/07/130711_cancer_prostata_omega3_rp.shtml

    Então, concluindo, como sempre devemos usar o equilíbrio. Não vamos parar de tomar um alimento ou produto só por que pesquisas indicam que o excesso pode levar a um câncer, mas também não vamos exagerar né?

quarta-feira, 12 de março de 2014

Clorpromazina:A minha relação com a "Clô"

Depoimento de um paciente sobre o uso da clorpromazina

    Há pouco mais de um mês resolvi dar um tempo em minhas andanças. Como a maioria sabe, estou no Arsenal da Esperança, aqui em Sampa. É um excelente abrigo, falarei dele em uma próxima oportunidade. 
     Apesar disso, ainda não me adaptei completamente à agitada cidade de São Paulo. O problema está em mim, tenho plena consciência disso. Mas, como já disse anteriormente, ter consciência ajuda, mas não resolve a questão.
    É um tanto o quanto difícil de se encontrar um lugar tranquilo e sem movimento para dar uma descansada e relaxada por aqui.  Até os poucos bem-te-vis e sabiás que avistei não cantam. Parecem estar sentindo falta da natureza, se sentindo estranho em um lugar que não é deles. Algo semelhante acontece comigo. 
    Carros, motos e ônibus numa correria desenfreada para chegarem aos seus destinos, não respeitando sinais, faixas de pedestres e outras regras de trânsito e, por que não, de educação e civilidade. 
    Com os pedestres não podia ser diferente. Nas ruas, nas estações de metrô é um salve-se quem puder. Fora o medo de ser assaltado, apesar de não ter nada e andar sempre com pouca grana no bolso. Andar com essas roupas que estou usando atualmente tem suas vantagens. Acho que, se a coisa continuar assim, os ricos irão se fantasiar de pobre só para não virarem alvo dos larápios. 
    Não estou acostumado com essa agitação toda e o resultado é que andei um pouco estressado aqui na terra da garoa. Até xinguei alguns motoristas que não têm o costume de darem a seta na hora de dobrar uma esquina. 
    Senti que poderia surtar a qualquer momento e resolvi apelar então para a cloprormazina, que levo comigo na mochila e a uso nessas situações de emergência. Se continuasse por mais um tempo nessa situação, o risco de um surto seria muito grande. Muitos portadores, não sei se por experiência própria ou por conhecerem bem a si mesmos, conseguem ter esse "insigth" e percebem quando estão prestes a surtar.
    Meu relacionamento com a "clo" começou no ano de 2003, após várias tentativas frustadas com outros medicamentos. Rigidez muscular, sonolência, aumento de apetite e consequentemente de peso são os principais reações adversas que tive. Me senti bem usando a cloprormazina,  mas a falta do diazepan falou mais alto e tive que voltar ao psiquiatra. 
    Na cidade onde me consultava, o atendimento era muito precário pelo SUS. Um único psiquiatra para uma população de 70 mil habitantes! Tá ruim? Para piorar ele só atendia uma hora por dia! Tá ruim? Ele sempre tinha o costume de chegar atrasado...
    Como disse, a cloprormazina me fez bem, mas estava sentindo a falta do diazepan que o psiquiatra havia cortado na última consulta. Ele então voltou com o pan nosso de cada dia, mas cortou a cloprormazina. Não quis me ouvir e então fiquei sem tomar os dois medicamentos juntos, que poderia ser uma boa naquela época, já que a "clo" quase não possui efeito sedativo. É de se estranhar que um profissional tire assim de uma hora para outra o diazepan de um psicótico, não precisa ser um médico para saber que esse medicamento causa dependência, tanto física como psiquica. Mas por que não os dois juntos? Essa era a pergunta que queria fazer, isso poderia ter mudado muita coisa, já que naquela época os surtos eram bem complicados para mim. Mas a consulta durava apenas cinco minutos e não dava para dizer nada, só para ouvir. O cara não tinha muita paciência, chegando a dizer que eu estava fingindo "estar esquizofrênico", talvez para conseguir algum benefício. Só gostaria de saber se esse psiquiatra teria condições de passar tudo o que passei e ainda passo por causa desse transtorno.
    O pior de tudo é que esse psiquiatra não havia me receitado o fenergan, que é usado para evitar possíveis alergias à cloprormazina. E eu tive. Os meus braços ficaram com muitas manchas vermelhas. Para piorar tudo, na cidade corria um boato de que eu estava com aids. E, segundo os moradores desta ilustre cidade, a alergia seria uma dos sintomas de que a pessoa está com HIV. Eu estava saindo e voltando dos surtos, estava triste e abatido, e isso parecia refletir na minha saúde, parecia que meu sistema imunológico estava fraco, estava tendo diarréias e havia emagrecido. Esse boato foi quase fatal para mim, pois, de tanto ouví-lo, comecei realmente a acreditar que estava com aids, pensando em me matar assim que os primeiros e verdadeiros sintomas aparecessem. A mania de perseguição estava tão severa que não acreditava nos testes de HIV que havia feito e que sempre deram negativo. Estava convicto de que até os laboratórios estavam contra mim, falsificando os resultados para que eu não pudesse retirar os medicamentos e assim me tratar.

    Essa foi a minha experiência com a cloprormazina. Ano passado cheguei a tomá-la por alguns dias, durante o carnaval, pois estava bastatnte estressado por conviver com os crackudos na cidade de Ipatinga. Apesar de ser um medicamento antigo, me sinto bem com ela. Consegue sossegar a minha mente sem me dopar. O fenergan é que dá muito sono, então tomo só a metade. Ainda há controvérsias sobre qual linha de medicamentos é mais eficaz: se os da primeira geração ou os da segunda, pelo que pesquisei. O certo é que os de segundo têm menos efeitos colaterais.
     A terceira experiência com a "clo" foi há poucos dias. Como já disse, São Paulo é uma cidade estressante. Estou evitando ao máximo ir ao centro da cidade, e estou ficando a maior parte do tempo na biblioteca do parque da mooca. Mas somente isso não foi o suficiente e tive que usar o medicamento por uns cinco dias consecutivos. Mas, tendo que acordar às seis da manhã,  fiquei mal pra caramba. Era sair do abrigo e tirar um cochilo na calçada mesmo. O desânimo chegou a tirar a minha fome. Fiquei andando como um robô, por causa da rigidez muscular. Ainda tive um violento torcicolo. Não acreditei quando lia a bula na internet e pude constatar que o medicamento era o responsável pelas terríveis dores nas costas e na nuca.
    Creio que a maioria já sabe que grande parte dos antipsicóticos age bloqueando a captação da dopamina que, segundo pesquisas, pode ser uma das prováveis causas da esquizofrenia. É uma substância necessária, mas na quantidade certa. O problema é que, se os medicamentos bloquearem demais a dopamina, teremos a insuficiência dessa substância, o que pode acarretar sintomas parecidos com o mal de parkinson, como a rigidez muscular e as tremedeiras. E eu não quero ficar com mal de parksison  né?
    Não estava dando para continuar com a "clo". Fiquei bastante abatido e todo dia era aquele martírio acordar cedo. Resolvi interromper a medicação e me conscientizar que neste caso específico os fatores ambientais são os maiores responsáveis pelo meu estresse e um possível princípio de um surto psicótico. Algumas vozes comentaristas até chegaram a dar suas caras, não adiantando andar com o fone de ouvido com o som do celular no  máximo.
    Depois de uma auto análise, resolvi adotar algumas práticas para evitar o stress. Procurei andar em vias menos movimentadas, evitando o centro da cidade e estou passando o dia praticamente na biblioteca. Ficar em São Paulo é um sacrifício, mas não estou dizendo que a cidade não presta. É o meu jeito de ser e também a esquizofrenia. Mas estou convicto do que estou fazendo. Tenho que economizar uma grana e voltar a morar em um quarto na minha querida BH. Esses meses que ficarei em Sampa vai dar para realizar parte do meu sonho de consumo, que é comprar uma tv lcd e um notebook. Não adianta alugar um quarto e ficar lá o dia inteiro trancado, sem ter nada o que fazer. É um longo caminho, mas sei que vou vencer mais essa. No final de tudo irei dar boas risadas de tudo o que passei nestes últimos meses. 

sábado, 8 de março de 2014

A arte de Morrigan



    Seu pseudônimo na web é Morrigan. A conheci em um dos vários grupos sobre esquizofrenia que existem no facebook. Certo dia postou algumas pinturas que, à princípio pensei que fossem de um pintor famoso qualquer. Mas não eram. Foram pintados por ela, ou melhor dizendo, através de suas mãos. Vou tentar explicar melhor: Morrigan me disse que suas visões a ajudam a produzir as obras. Um dom? Mediunidade? Sinceramente não sei. Só sei que existe uma relação muito forte entre a "loucura" e a arte. Van Gogh era esquizofrênico. 
    Abaixo, palavras da própria autora dos quadros, explicando como tudo começou:
    "Nunca tinha pegado em um pincel, ao menos em uma tela. Também não tinha paixão por arte, nesta época só trabalhava e mais trabalho. 
    Quando tive um surto e fui parar em um hospital aos prantos sem saber o que estava acontecendo. 
Fiquei ali sentada na recepção do pronto socorro esperando ser chamada, sem saber o que fazer. 
Peguei uma folha que havia em minha bolsa pois sai do trabalho e meu trabalho é de secretária estava com material umas folhas de sulfite, procurei desesperadamente uma caneta um lápis mas nada encontrei, foi que me deparei com um baton e foi ele que me salvou naquele momento a folha de sulfite e o baton começou a dar formas, começou em pequenos pontinhos e terminou em um monte de desenhos, dali então nunca mais parei e hoje cada vez mais e mais minha mente coloca para fora tudo aquilo que tem de dentro pra fora em arte. 
    Depois de várias e várias vezes desenhando em folhas com giz de cera e com caneta e lápis, eu não conseguia me conter,aquilo não era o bastante tinha que ter mais cores mais e mais cada surto cada choro angústia, nervoso tinha que ter mais emoção no papel, foi que fui pegando umas tintas que tinha de tecidos e fui pintando em cartolina, mas só tinha preta e branca e azul e verde elas não me deixavam dar forma me deixavam irritadas, comprei várias canetinhas com o tempo e lápis e caneta de contorno e foi ali que foi saindo dia a dia um desenho uma forma uma cor, com custo comecei a comprar o material para começar a pintar em tela com tinta óleo e foi que me encontrei na minha paixão que quando começo não paro fico horas e horas com músicas clássicas. Hoje trabalho, faço pinturas de acordo com sonhos das pessoas, descobri que se a pessoa me mandar um sonho dela eu transformo em arte e a vida também eu transformo em arte, se me perguntar como é que é isso acontece eu não sei explicar, mas é assim eu quando vejo está lá a pintura feita. Sempre peço para a pessoa me mandar o sonho ou a vida e o repertória da música que ela quer que eu entre na vida eu faço. 
Hoje sou diagnosticada com transtornos mentais e ele me deu isso a arte........."







    Procuro divulgar aqui no blog o trabalho artístico de portadores de qualquer tipo de sofrimento mental, sejam esquizofrênicos, bipolares, boderlines e tantos outro mais. Temos que nos unir para sermos mais fortes e mais respeitados, principalmente. 
    Quem desejar que sua obra seja divulgada é só entrar em contato comigo por email ou por telefone, é só clicar em contatos, no menu acima. 
   Além pinturas, são aceitas músicas, poesias, textos, blogs, ou qualquer outra forma de expressão artística. 

...

Escutem o louco

    Esse texto me passaram pelo facebook e achei muito interessante e tem haver com um post recente que publiquei. Ele é de autoria de Eliane Brum. Resolvi publicá-lo aqui no blog, apesar de não ser fã muito do tal de control V + control C. Mas estou citando o autor e a fonte do que está escrito aqui, sem nenhuma modificação. Vale a pena ler e refletir.

Escutem o louco

O homem que empurrou uma passageira nos  trilhos do metrô desnuda o momento perturbador vivido pelo Brasil

  De repente, o taxista aumentou o som da pequena TV acoplada no console do carro. No banco de trás, eu parei de ler e afinei os ouvidos. Era meio-dia da sexta-feira de Carnaval (28/2). O homem que, dias antes, havia empurrado uma passageira nos trilhos do metrô de São Paulo tinha sido preso. A mulher teve o braço amputado. O agressor sofre de esquizofrenia, destacou o apresentador de TV. “Louco”, decodificou de imediato o taxista. Doença triste, disse o apresentador na TV. Ao ser preso, continuou o apresentador, o agressor afirmou que a empurrou porque sentiu raiva. Essa parte o taxista não escutou. Algo lá fora o havia perturbado. Colou a mão na buzina, abriu a janela do carro e xingou o motorista ao lado, que tentava mudar de pista. Perdigotos saltavam da sua boca enquanto ele empunhava o dedo médio com uma mão que deveria estar no volante. Fechou a janela, para não perder a temperatura do ar-condicionado, e voltou a falar comigo. “A polícia tem de tirar os loucos da rua”. A quem ele se refere, pensei eu, confusa, olhando para fora, para dentro. Era ao louco do metrô.

    Há algo de trágico nos loucos. E não apenas o que é definido como loucura nessa época histórica. Há uma outra tragédia, que é a de não ser escutado. Sempre que alguém com um diagnóstico de doença mental comete um crime, a patologia é usada para anular as interrogações e esvaziar o discurso de sentido. A pessoa não é mais uma pessoa, com história e circunstâncias, na qual a doença é uma circunstância e uma parte da história, jamais o todo. A pessoa deixa de ser uma pessoa para ser uma doença. Se há um histórico, é o de sua ficha médica, marcada por internações e medicamentos – ou a falta de um e de outro. Esvaziada de sua humanidade, o que diz é automaticamente descartado como sem substância. A doença mental, ao substituir a pessoa, explica também o crime. E, se não há sujeito, não é preciso nem pensar sobre os significados do crime, nem sobre o que diz aquele que o cometeu.
   Mas o que essa escolha – a de reduzir uma pessoa a uma patologia e a de anular os sentidos do seu discurso – diz da sociedade na qual foi forjado esse modo de olhar? Se Alessandro de Souza Xavier, 33 anos, o homem que na terça-feira (25/2) empurrou Maria da Conceição Oliveira, 28, no metrô, for escutado, há algo de particularmente perturbador na justificativa que confere ao seu ato. Alessandro diz: “Fizeram um mal pra mim, e eu descontei. Fiz porque estava nervoso com o pessoal do mundo.”
O louco não expressa apenas a sua loucura. Ele também denuncia a insanidade da sociedade em que vive
    O que há de particularmente perturbador nessa fala é que, quando escutada, ela desnuda o atual momento do Brasil. Vale a pena lembrar que o louco é também aquele que diz explicitamente do seu mundo. Sem mediações, ao dizê-lo ele pode sacrificar a vida de outros, assim como a sua. Vale a pena lembrar ainda que o louco não expressa apenas a sua loucura. Ele denuncia também a insanidade da sociedade em que vive.
    Ao interrogar sobre os sentidos do que Alessandro diz, quando explica por que empurrou Maria, é necessário olhar para os outros crimes que viraram notícia nos últimos dias. Nenhum deles, até agora, relacionado a doenças mentais. Torcedores do São Paulo bateram com barras de ferro em um torcedor do Santos que esperava o ônibus. Bateram nele até matá-lo. Ao deparar-se com blocos de Carnaval interrompendo o trânsito, na Vila Madalena, bairro de classe média de São Paulo, um homem acelerou o carro e feriu dez pessoas. Quem estava perto o arrancou do veículo e passou a agredi-lo. Quando ele conseguiu fugir, destruíram o carro. Um casal de lésbicas foi espancado ao sair de um bloco de Carnaval, no Rio. Uma delas teve a roupa arrancada. Apenas uma pessoa na multidão ao redor tentou ajudá-las. Em Franca, no interior de São Paulo, um adolescente correu atrás de um suspeito de assalto e lhe aplicou um golpe chamado de “mata-leão” (estrangulamento). O suspeito, de 22 anos, teve um infarto após ser imobilizado e morreu no hospital. Um morador de rua foi linchado em Sorocaba (SP) por ter pegado um xampu de um supermercado. Teve afundamento do crânio. No Rio, mais um adolescente foi amarrado e agredido depois de furtar um celular. Linchamentos eclodiram em todo o país depois do caso do garoto acorrentado com uma trava de bicicleta no Flamengo. Nas semanas anteriores, dois manifestantes acenderam um rojão num protesto no Rio, matando um cinegrafista. Na Baixada Fluminense, um homem executou um suspeito de assalto com três tiros, em plena rua, durante o dia, assistido por vários. Mais de 40 ônibus foram incendiados em São Paulo em 2014.
A lucidez do louco é a de não vestir como razão a nudez do seu ódio – ou do seu medo
    O discurso do louco é encarado como uma afirmação (e confirmação) da sua loucura, o que é outra forma de não escutá-lo. No caso de Alessandro, uma das provas da loucura do louco teria sido ele dizer que jogou Maria nos trilhos do metrô por raiva e também por vingança. Explícito assim. Outra prova da loucura do louco revelou-se ao afirmar que não a conhecia, que a escolheu de forma aleatória. “Desconexo” – foi o adjetivo usado para definir o discurso de Alessandro. Sua vítima não era torcedora do Santos, não era lésbica, não tinha furtado um celular ou um xampu, as desrazões interpretadas como razões. Por que, então? O louco confessou: Maria não era Maria, já que não a conhecia nem sabia o seu nome, mas o “pessoal do mundo”. A lucidez do louco talvez seja a de não vestir como razão a nudez do seu ódio – ou a nudez do seu medo. Por isso também é louco.
    Diante da violência que irrompe no Brasil em todos os espaços, talvez seja a hora de escutar o louco. Talvez o fato de ele atacar no metrô não seja um detalhe descartável, uma coincidência destituída de significado. No mesmo dia em que Alessandro foi preso, morreu no hospital Nivanilde de Silva Souza, aos 38 anos. No mesmo dia em que, na Estação da Sé, Alessandro empurrou Maria, na Estação da Luz um trem atingiu a cabeça de Nivanilde. Ela tinha dito a um estagiário da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) que estava grávida, o que lhe assegurava o direito a entrar no vagão especial. O estagiário disse a ela que teria de apresentar um documento comprovando a gestação. Os dois teriam se empurrado, seguranças deram voz de prisão à Nivanilde. Na confusão, ela teria caído na plataforma. O trem bateu na sua cabeça.
    No início de fevereiro, a linha-3 vermelha do metrô parou por cinco horas depois da falha em uma porta na estação da Sé, a mesma em que Alessandro empurrou Maria. No verão paulistano mais quente desde 1943, o ar-condicionado foi desligado. Pessoas vagavam pelos túneis, algumas desmaiaram, grávidas e velhos esperaram dentro de vagões abafados por horas. Pelo menos 19 dos 40 trens que circulavam na linha foram depredados.
O outro, qualquer outro, tornou-se inimigo e competidor por um lugar no trem que nos engole e nos cospe em seu vaivém automático
    Os protestos de junho de 2013 começaram por causa das tarifas do transporte público, em São Paulo os 20 centavos de aumento da passagem. Naquele momento, milhares romperam o imobilismo, no concreto e no simbólico, e passaram a andar por cidades em que não se andava, vidas consumidas em ônibus e metrôs superlotados. O aumento de 20 centavos foi cancelado, mas o péssimo transporte público continuou mastigando o tempo, desumanizando gente. Basta parar para esperar o trem nos horários de pico para ser empurrado, xingado, odiado. O outro, qualquer outro, tornou-se nosso inimigo e nosso competidor por um lugar no trem que nos engole e nos cospe em seu vaivém automático. Somos passageiros que não passam, e a tensão dessa impossibilidade cotidiana pode ser apalpada. A violência é gestada como uma promessa para o segundo seguinte.
    Então o louco vai lá e empurra a mulher sobre os trilhos. Rompe o imobilismo e empurra aquela que espera. Porque é louco. Caso isolado, nenhuma conexão com nada, desconexo é o seu discurso, fora da história é o seu gesto, a insanidade é só dele. Basta eliminá-lo, tirá-lo de circulação, para que a sociedade brasileira volte a ser sã. E o metrô de São Paulo um espaço de convivência agradável e pacífico, marcado pela cordialidade
    Talvez estejamos todos não loucos, mas no lugar do louco. Já não nos subjetivamos, tudo é literal. Nos mínimos atos do cotidiano nos falta a palavra que pode mediar a ação, interromper o gesto de violência antes que se complete. Mas talvez estejamos no lugar do louco especialmente porque nem escutamos, nem somos escutados. E quem não é escutado vai perdendo a capacidade de dizer. Só resta então a violência.
Reprimir os protestos é uma forma brutal de não escutar o que dizem aqueles que ainda se preocupam em dizer
    Os protestos iniciados em junho pelos 20 centavos e agora centrados na Copa do Mundo são um dizer. Responder a eles com repressão – seja da polícia no espaço público, seja em projetos de lei que transformam manifestantes em terroristas, seja anunciando que o Exército vai para as ruas em tempos de democracia – é uma forma brutal de não escutar aqueles que ainda se preocupam em dizer. É talvez a maior violência de todas.
    É preciso ser muito surdo para acreditar que prender todos, “deter para averiguação”, criminalizar manifestantes é suficiente para voltarmos a ser o Brasil cordial e contente que nunca existiu, 200 milhões em ação torcendo pela seleção canarinha. Que o dizer de quem deseja um Brasil diferente seja hoje expressado no campo simbólico do futebol é mais uma razão para escutá-lo, ao mostrar que estamos diante de novas construções do imaginário.
    Escutem o louco. Para não colocar aqueles que protestam no lugar do louco, no lugar daquele que não é escutado porque não teria nada a dizer. E depois surpreenderem-se com a resposta violenta, convencendo-se de que não têm nada a ver com isso.


  


terça-feira, 4 de março de 2014

Esquizofrênico: inimputável ou não?

 
   
o  cara saiu rindo depois do fato....
Nos últimos dias aconteceram dois fatos semelhantes aqui em São Paulo, mais especificamente nas estações do metrô da Sé e na plataforma de trem da estação da Luz.
    O primeiro teve como vítima uma mulher de 28 anos. Enquanto esperava o transporte simplesmente foi empurrada para os trilhos do metrô por um rapaz. Infelizmente ela foi atingida pela composição do metrô e e acabou perdendo um braço, mas não corre risco de morrer.
    As câmaras de vigilância flagraram o ato e o cara foi encontrado na cidade de Extrema, sul de Minas Gerais. Ele não ofereceu resistência e foi levado para uma delegacia aqui de Sampa. Segundo familiares, o rapaz é esquizofrênico. Mais detalhes no link abaixo

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/02/delegado-diz-que-homem-que-jogou-mulher-em-trilho-saiu-rindo-em-sp.html

     O segundo caso foi bem parecido. Uma mulher de 38 anos foi atingida na cabeça por um trem da CPTM e foi levada para um hospital da cidade, onde ficou internada em estado de coma por alguns dias. Infelizmente não resistiu aos ferimentos e veio a falecer.
    Ainda não se sabe ao certo o que aconteceu realmente, pois somente existe a versão dos funcionários da CPTM. Pelo que consta, a mulher, ao tentar entrar no vagão destinado à gestantes e idosos, foi barrada por um funcionário, que é estagiário e tem apenas 17 anos. Ela alegou que estava grávida, e como a barriga provavelmente não estava saliente, o rapaz acabou não acreditando e pediu provas, que não foram dadas. Então começou a discussão. Segundo os funcionários, a mulher estava exaltada e deu um empurrão no rapaz, que chamou reforço e deram voz de prisão à ela. Ao resistir, um segurança deu uma rasteira nela, que na confusão acabou caindo nos trilhos, sendo atingida por um trem.  Ainda não se tem certeza se ela se jogou ou foi empurrada pelos funcionários. As imagens existem, mas não foram divulgadas para a imprensa por enquanto. Alguns usuários do metrô comentaram que os seguranças exageraram na ação, mas nenhum deles chegou a ser preso. Detalhes no link abaixo:
http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/sp-mulher-morre-atingida-por-trem-da-cptm-apos-discussao,1855bb37e0974410VgnVCM20000099cceb0aRCRD.html

    Agora uma pergunta: a família do rapaz apresentou um laudo provando que ele é realmente portador de esquizofrenia? Indago isso por que está virando moda dizer que uma pessoa é esquizofrênica quando esta comete um ato de violência. Ou será que os familiares do rapaz não foram orientados por um advogado, já que se conseguirem provar que ele é portador, poderá ser considerado inimputável ou ter um outro benefício qualquer? E no caso dos funcionários da CPTM, não seria imprudente colocar um cara de apenas 17 anos em uma função que exige experiência em um local tão agitado e estressante?
    A cada dia que um advogado vem à mídia afirmar que seu cliente é esquizofrênico, o preconceito aumenta mais. Alguns podem até estarem dizendo a verdade, mas todos nós conhecemos como esses "profissionais" atuam, procurando qualquer brecha na lei para livrarem seus clientes de uma pena ou então para diminuí-la.
    Não estou aqui para dizer que devemos passar as mãos na cabeça dos esquizofrênicos, que somos uns coitados, etc. Existem esquizofrênicos bons, maus, com caráter e sem caráter. A esquizofrenia não influi nestas qualidades pessoais.
   Sou a favor de que os casos sejam muito bem investigados e, se for comprovado que o infrator estava realmente surtado e não tinha consciência dos seus atos, que seja levado para um manicômio judiciário, onde possa cumprir a pena e receber um tratamento adequado.
   E tem outra coisa: se for comprovado que o portador abandonou o tratamento por conta própria, que a pena seja ainda mais rigorosa, já que no primeiro surto realmente não temos consciência de nada e ficamos muito assustados mesmo.
    Foi o que aconteceu no caso do atirador de São Paulo, que saiu de casa e abandonou o tratamento, indo morar na casa de uma psicóloga. No momento em que a polícia chegou na residência onde estava com a psicóloga, efetuou três disparos. Felizmente o pior não aconteceu, só um tiro pegou de raspão em sua companheira e outro em um policial.  Segundo consta, os policiais estavam ali para ajudar a interná-lo já que sua família pediu a sua interdição. O estranho é que como a psicóloga não percebeu que ele estava surtado, pois ele falava em discos voadores, afirmando estar chipado e com mania de perseguição? Será que ela também estava surtada?
http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/sp-interdicao-judicial-seria-motivo-para-homem-atirar-em-3-pessoas,f55803334f62d310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html

    Outro caso conhecido é o do atirador de Realengo. Um dia após a tragédia um psiquiatra afirmou em uma emissora de TV que o cara era esquizofrênico. Oras, não precisa nem ser um expert em psiquiatria forense para deduzir que o elemento não agiu sob o efeito de um surto psicótico. Ele era na verdade um psicopata, isso sim, pois agiu friamente, arquitetando com detalhes o seu cruel plano. Chegou a gravar alguns vídeos, provavelmente fez um curso de tiro, pois, pelo que deu para perceber, tinha boa pontaria, acertando várias crianças em um curto espaço de tempo. Também sabia carregar o tambor do revólver com rapidez, ou seja, tinha prática em tiro.
    O esquizofrênico, quando está surtado, age por impulso, tendo o seu raciocínio totalmente prejudicado pelas suas alucinações e pensamentos, não tendo a frieza de um psicopata. E vale também ressaltar que, segundo pesquisas, os esquizofrênicos fazem mais mal a si mesmos do que a outras pessoas. Dados revelam que 50% dos portadores já tentaram o auto-extermínio e que 15% conseguiram concretizar o ato.

    Como já disse, não quero que passem a mão na cabeça dos portadores de esquizofrenia, só quero que a verdade seja conhecida por todos e que não acabe virando moda esse negócio de dizer que uma pessoa é esquizofrênica para aliviar a pena dela. Deveria haver uma lei que punisse esses advogados que procuram se aproveitar erradamente dessa lei que torna o esquizofrênico inimputável. O que vocês acham?