quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Passos dos Jesuítas: 9° dia

praia em Santos

14/11/2014-terça feira-Santos-Guarujá-Bertioga
    Último dia no abrigo de Santos. Sou o último a tomar o café da manhã. Queria sair por último para evitar as despedidas, já que fiz boas amizades por lá, e, como já disse, não gosto muito dessas situações.
    Céu sem nuvens, presságio de mais um dia calorento no litoral paulista. Aliás, faz calor em Santos até com o céu nublado nessa época. Depois do café, parti para o litoral de Santos, mas antes comi um brigadeirão de chocolate, não pude resistir a essa tentação ao vê-la no balcão do restaurante próximo do abrigo.
aquário municipal

    Sei que não posso misturar café com chocolate, fico meio agitado e ansioso. Isso fez com que eu errasse o caminho e pegasse a balsa errada para o Guarujá. Esse tipo de transporte é gratuito de Santos para Guarujá, mas o inverso já é cobrado. Somente este ano é que fiquei sabendo que Santos é uma ilha. É que eu não era muito fã das aulas de geografia.
   Somente quando desembarquei no Guarujá é que fiquei sabendo que estava no caminho errado e então tive que voltar para Santos. Estava meio agitado e elétrico. Várias vezes esquecia e ficava transitando na ciclovia.
    - Você não tá na roça não!- exclamou um ciclista.
forte de São João da Barra

    Às nove e meia consegui desembarcar no local certo no Guarujá. O início é feito em um bairro de classe baixa, de pescadores e pessoas que me olhavam com certa estranheza. Será que sou tão esquisito assim? A maioria das ruas não tinham placas e as pessoas geralmente não sabiam dar informações, mesmo estando na rua que estava procurando. O caminho que imprimi no site do governo do estado de São Paulo nos leva até o forte de São João da Barra e depois nos faz voltar ao ponto de partida, o que me deixa um pouco irritado. Depois de algumas fotos do forte, entrei por uma estreita estrada de asfalto e segui por cerca de sete quilômetros, até chegar às belíssimas praias do Guarujá.

    As ondas dessa praia não são muito altas, mas dava para surfar nelas. De cara dá para se perceber o alto padrão de vida das pessoas que frequentam o local: carros luxuosos, apartamentos bonitos e tudo muito caro. Novamente tive que pechinchar e consegui um desconto de três reais na hora do almoço:
    - É que o orçamento está curto, estou fazendo o caminho dos passos dos jesuítas...
    Nem descansei depois do almoço, estava me sentindo bem. Voltei a caminhar pela orla do Guarujá, apesar do forte calor do meio dia. Estava num pique bom, a musculatura em ordem e a mochila parecia não pesar tanto assim. Mas tinha um porém: as bolhas! Elas começaram a arder por volta das duas da tarde, dificultando um pouco a caminhada. Mesmo tendo as canelas finas, vou ter que comprar um par de botas próprias para caminhada. Canela fina e botas não é uma combinação muito legal né? Esse tênis que estou usando é macio e tals, mas aperta os dedos dos pés e provoca as bolhas.
belas praias no Guarujá

    Tive que continuar a caminhada de chinelo, mas o calor foi ficando cada vez mais forte. Por volta das três da tarde parei em uma lanchonete a fim de tomar um açaí e repor as energias.
    -Quanto custa um pote de açai?-perguntei.
    - Oito reais. - respondeu o cara, dentro do balcão.
    -Nuss! Lá em Minas Gerais é cinco!- tentei pechinchar.
    - Isso é o açaí puro, cada item custa um real.
    - "Ai cê mata nóis né? Não dá para dar um desconto não? É que estou fazendo o caminho dos jesuítas...
    - Chegai ai!- disse o cara, que era meio gordo e tinha uns vinte anos no máximo. Ele pegou um pote de 500ml e o encheu todo me entregando em seguida.
    -Valeu cara, tudo de bom para você! - respondi alegre e meio sem graça, não sou muito de ficar pedindo as coisas, mas nessas horas é preciso vencer a timidez, as coisas estão mais caras do que eu havia imaginado e, se desse bobeira, poderia estourar o orçamento da viagem. Na próxima vez não viajo na alta temporada...
    No final do percurso da praia do Guarujá pega-se a estrada do Pernambuco. Uma placa informa que faltam 20km até a balsa de Bertioga. Já são três e meia da tarde, e calculo que não haverá tempo suficiente para se chegar ao albergue da cidade de Bertioga.
    Então pego um busão até o bairro de Perequê, onde pego a balsa, que demora uns cinco minutos para fazer a travessia Guarujá Bertioga. Depois de andar por uma hora encontro o albergue da cidade. O cara da portaria me pede para dar uma passada na delegacia, para ver se está tudo ok com os meus documentos e com a minha situação.
balsa para Bertioga

    A delegacia está agitada. Um cara fazendo queixa contra um policial, um outro se dizendo vítima de estelionato, ao levar um cano de dois mil reais de um empréstimo que fez mas teve que pagar um seguro antes. De repente chega uma garota brigando com sua mãe. A discussão é tensa. A mãe dizendo que o namorado dela não presta e a garota ameaçando sair de casa. O delegado de plantão tem que ter jogo de cintura para contornar a situação. Cheguei a gravar a discussão, mas não sei o que aconteceu, de repente todos os meus arquivos desapareceram do cartão de memória, apesar de ocuparem ainda espaço nele! Será que a delegacia tem um dispositivo capaz de detonar o cartão de memória de alguém que esteja gravando alguma coisa? Que bruxaria é essa?
    Depois do furdunço, o delegado olhou a minha situação e me encaminhou para o albergue, que parece ser uma clínica de recuperação para viciados em drogas. O cara me demora uma hora para preencher a minha ficha, perguntando coisas da minha vida toda, até se eu tenho apelido. Disse que não tinha apelido, mas o cara não acreditou, não se convenceu que uma pessoa não possa ter apelido. Argumentei dizendo que sempre gostei de andar sozinho e tals, mas ele queria por que queria que eu tivesse um apelido. Para acabar com a discussão, me lembrei da infância e disse que meu apelido era Julinho. Pronto! Finalmente poderia entrar para o albergue e tomar um bom banho. Antes o cara me apreendeu uma tesourinha(daquelas que dobram) alegando que poderia servir de "armamento".
assim o esquizo não vai comer camarão não...

    Cheguei a Bertioga bem fisicamente, poderia caminhar até mais, mas, infelizmente as bolhas estão incomodando muito. Creio que daqui para a frente não haverá mais albergues para descansar, e ai terei que me virar, eu e minha barraca, com a proteção do meu anjo da guarda.

- consegui recuperar os vídeos do meu celular, olhem só o furdunço na delegacia

2 comentários:

  1. Adoro ler o seu blog, de verdade. Se voce pudesse, gostaria que escrevesse mais sobre a esquizofrenia. Abraços <3

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    1. Olá Ana, vou escrever um pouco mais sobre esquizofrenia depois da viagem. Não me considero a pessoa ideal para falar sobre o assunto, mas vou tentar, da maneira que sei, de uma forma simples, de tentar descomplicar algo tão complicado como é a esquizofrenia. Claro que é cada caso é bem diferente um do outro, mas falando um pouco de mim, talvez esteja falando também da esquizofrenia. Obrigado pela visita ao blog.

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