terça-feira, 21 de março de 2023

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    Tudo começou no ano de 2012. Há dois anos atrás havia me aposentado por conta da  minha condição de portador de esquizofrenia paranoide. 
    No início tudo foi uma maravilha, ou melhor dizendo, um tremendo alívio, para tentar melhor definir o que senti quando recebi a carta do INSS.  Os tratamentos que tentei não deram certo, me fazendo passar por situações complicadas no meu emprego. Então fui parar nas ruas por não estar conseguindo mais trabalhar, mas, felizmente apareceram boas pessoas em meu caminho e que me auxiliaram muito. Se hoje estou aqui para contar estas histórias que escrevo aqui neste humilde blog é por conta dessas pessoas enviadas por Deus que apareceram na hora e nos lugares exatos. 
    Foi um alívio pois me sinto bem no meu cantinho, algo que não estava acontecendo por conta do trabalho. Saí de casa aos 17 anos e sempre morei sozinho, pois sempre precisei de um tempo comigo mesmo. Sozinho é onde vivo o meu mundo, onde respiro melhor e consigo relaxar e ficar diboa. Não digo isto em tom de amargura, numa tentativa de afirmar que o mundo e as pessoas não prestam. É apenas o meu jeito de ser, apesar de que o mundo está atualmente infestado de pessoas ruins, principalmente vestidas de cordeiro.
    Mas, dois anos após a aposentadoria o tédio se instalou na minha mente.. Minha vida basicamente se resumia em ir ao restaurante popular de Ipatinga-MG e umas duas vezes por semana ir ao centro de convivência de portadores de sofrimento mental. E também jogava um futebolzinho no parque Ipanema, um dos cartões postais da cidade. Me lembro que na primeira vez que disse alguma coisa na pelada e o pessoal riu muito, pois a maioria pensava que eu era mudo. Mas eles me respeitavam do jeito que eu era e o futebol sempre foi um bom remédio natural contra o stress, talvez provocado por uma esquizofrenia ainda latente em minha vida. 
                                                    Música: Tédio Artista: Biquini Cavadão

     Então resolvi comprar um computador em suaves prestações nas Casas Bahia. Era um CCE que saiu bem caro, daria para montar um bom PC em uma dessas lojas de informática. Mas na época não entendia nada de computadores, apenas achei o PC da CCE bunitinho e então resolvi adquirí-lo.  Até os 42 anos de idade não havia encostado um dedo em um teclado de computador. Na verdade tinha medo de teclar, pensava que uma única tecla poderia desconfigurar o equipamento todo. Me lembro que ficava admirado vendo as pessoas digitando sem olhar para o teclado em uma velocidade incrível. Pensava que elas haviam feito algum pacto com o tinhoso para fazer tal proeza. 
    Então, para também fazer um teste comigo mesmo, resolvi fazer um cursinho de informática. Era um teste muito importante,  pois na época tinha muitas dúvidas sobre a esquizofrenia. E a de que o transtorno poderia atrapalhar a capacidade de aprender coisas novas era uma delas. 
    Me lembro que, por volta dos 25 anos havia pensado em aprender a usar o computador. Mas logo desisti, por que naquela época as salas geralmente disponibilizavam um computador para duas pessoas. E depois dos vinte anos  já era um pouco, ou melhor, bastante antissocial. Atualmente sou ultra antissocial. 
    Algumas coisas negativas que acontecem em nossas vidas servem para se tirar boas lições. Depois dos surtos passei a acreditar mais em mim e não dar tanta atenção a opinião alheia. 
   Então, apesar do receio resolvi me inscrever no cursinho de informática de uma deputada na cidade. O diploma era bem reconhecido e então havia muitas pessoas na sala, a maioria jovens de no máximo 23 anos. Pensava que iria passar vergonha, não aprendendo nada e tirando notas ruins. Mas, como disse, depois dos surtos vi que posso tentar algumas coisas, as palavras não me afetam como antigamente. 
    Para a minha própria surpresa me sai bem tanto no curso de digitação como no de informática. Também no curso de digitação entrava às oito horas da manhã e só saía por volta das quatro horas da tarde, com um intervalo de duas horas para o almoço. . Me lembro que de noite ficava até enxergando estrelinhas de tão estressado que ficava. 
    No curso de informática também me saí muito bem, com ótimas notas. Respondia com convicção as perguntas feitas pela  professora e isso impressionou à todos os alunos. A verdade é que nem eu tinha certeza se as respostas estavam corretas, mas respondia com tanta convicção que até a professora ficava impressionada, olhando para o alto e perguntando se o que eu havia respondido tinha algum sentido. 
    Parei de frequentar o cursinho já no finalzinho, não tinha intenção de ganhar um diploma e sim sanar a dúvida que estava me atormentando. A esquizofrenia não havia afetado muito a minha capacidade de aprender coisas novas! Resolvi não terminar o cursinho pois não estava com a mínima vontade de ir à festa de formatura, que seria em um dos salões mais bonitos da cidade e teria muito som alto e muita gente falando sem parar. 
     Fiquei vários meses só com o PC, pois tinha que pagar as prestações e não sobrava grana para contratar um plano de internet. Ficava o dia inteirinho lendo o livro de informática do cursinho e mexendo no word escrevendo algumas coisas e no paint tentando ser um artista moderno. 
    Depois dos dozes meses de carnê consegui contratar uma internet com a incrível velocidade de 120KBPS!
Em um PC sem internet não há muito o que se fazer...

    Umas das primeiras coisas que fiz foi abrir a minha conta no Orkut e entrar para as comunidades sobre esquizofrenia e outros transtornos mentais. E também comecei a pesquisar mais sobre o transtorno, pois nas consultas nem os psicólogos e nem os psiquiatras pareciam dispostos a falar sobre o assunto. 
    Nessas comunidades pude perceber que não era a única pessoa do mundo a ter os sintomas da esquizofrenia. Isso foi de uma ajuda gigantesca para o começo de minha melhora,  pois acreditava o que eu tinha era puramente espiritual. 
    Então, com o conhecimento que fui adquirindo resolvi começar a gravar vídeos no youtube. Mas logo percebi que falar não é o meu forte, e então  resolvi fazer um blog, que foi muito bem aceito por várias pessoas. Desde criança sempre fui muito curioso, e a leitura era uma das principais atividades que tinha. Lia tudo o que aparecia na minha frente, e acredito que isso tenha ajudado um pouco a escrever textos. 


o blog também é lido em outros países, inclusive na Europa. 
    Escrever é uma excelente terapia para o meu caso. Me lembro que sempre tinha um caderno e uma caneta, para escrever coisas do meu dia a dia. Não era um diário, era apenas lembranças boas e interessantes que eu anotava para um dia me lembrar. E também usava o caderno meio como um psicólogo, botando para fora alguns sentimentos e pensamentos. No meu caso era uma terapia que funcionava bem, pois na época acreditava que psicólogo era coisa de “maluco”. 
    Acessar o blog e ler os comentários positivos me faziam um bem danado.(e ainda fazem!) E me faz sentir útil também.  Os leitores afirmavam que os meus escritos estavam ajudando e muito a entender um pouco o que é esquizofrenia. Os sites dos psiquiatras na época usavam uma linguagem um tanto o quanto científica e acadêmica, fazendo com que os familiares e portadores logo desistissem de se informar sobre o assunto. De complicado já basta o transtorno... 
    E a informação é muito importante, principalmente sobre a esquizofrenia, algo que na época ainda era cercada por muitos mitos e preconceitos. Não que não seja hoje em dia, mas antigamente a pessoa com esquizofrenia sofria muito mais com a falta de informação do público em geral.
    Por conta disso que também resolvi escrever o blog. Falar de uma maneira simples e direta sobre o que é ter um transtorno mental ainda não totalmente desvendado pela ciência. A esquizofrenia no ponto de vista do portador, com suas queixas e reclamações. Digo reclamações pois geralmente os sites dos profissionais da saúde mental meio que idolatram os antipsicóticos, afirmando que são uma maravilha e que resolvem tudo em poucos dias. 
    A verdade não é bem essa, digo isso não só baseando no meu caso, e sim nas queixas dos portadores nas comunidade do Orkut e atualmente nos grupos do facebook. Não acho que o tratamento da esquizofrenia em nosso país seja um sucesso. Acredito que ainda tem muito o que melhorar, pois no Brasil esquizofrenia é quase sinônimo de aposentadoria ou algum outro benefício social.  Uma pequena exceção consegue voltar ao mercado de trabalho, isso quando consegue começar a trabalhar. Outros conseguem alguma ocupação nas empresas ou firmas dos país ou parentes próximos. 
    Os efeitos colaterais dos medicamentos são o maior empecilho para o paciente continuar o tratamento. As pessoas em geral pensam que é teimosia ou frescura não querer tomas os remédios, mas, simplificando, tomar um antipsicótico é como ter uma dengue permanente, entre outras coisas. 
     O estigma e o preconceito que cercam a esquizofrenia também dificulta e muito o início do tratamento. Afinal, ninguém quer ser rotulado como "louco", que é o como são vistos os portadores do transtorno por muitas pessoas. 
    Onze anos se passaram, e me sinto feliz com essa nova marca. Ter mais de um milhão de visualizações em um blog em um país onde a leitura não é muito incentivada é uma proeza sim. E ainda conta o fato de sempre estar criticando os antipsicóticos e, consequentemente, não ter o apoio de pessoas influentes. Mas sempre serei assim, afinal a liberdade não tem preço. 
     Não vou desistir e continuarei por aqui falando sobre o assunto e reivindicando melhores tratamentos para a esquizofrenia e outros transtornos mentais. 
    Os profissionais da saúde mental dizem que os antipsicóticos atuais são melhores do que o tratamento da década de 40 e 50. Sim, é verdade, qualquer coisa é melhor do que uma lobotomia, um eletrochoque ou um manicômio lotado sem a mínima condição de higiene e com um mínimo de dignidade. 

  Sei que essas minhas queixas podem desagradar muitas pessoas, principalmente os profissionais da saúde mental. Não sou totalmente contra a psiquiatria, só acho que em nosso país pegam pesado no uso das medicações, não é á toa que somos campeões mundiais no uso do rivotril e outros medicamentos. "Os  medicamentos lideraram a lista de principais agentes tóxicos que causaram intoxicações em seres humanos com 30,5% das ocorrências. Em seguida, vem a intoxicação por animais peçonhentos, sobretudo escorpiões (19,9%) e produtos sanitários de uso doméstico (11 %)" 
    Sou contra os maus profissionais, que pensam somente no lucro acima de tudo, sou contra aqueles que tem vínculos com a indústria farmacêutica e que prescrevem seus medicamentos mesmo que não sejam tão necessários. Tratamento da esquizofrenia não é somente medicação, terapia ajuda e muito. E muitas coisas podem ser terapia. 
     Terapia é tudo o que pode nos ajudar a melhorar, é fazermos o que gostamos, de estarmos em lugares em que nos sentimos bem. Terapia é estar em um bom ambiente e estar longe de pessoas negativas e que querem o nosso mal. Enfim, respirar bons ares e ter bons pensamentos. 

Agradecimentos

    Agradeço nesta postagem aos bons profissionais que encontrei nas consultas e espero que continuem assim, mesmo que não estejam obtendo tantos lucros se estivessem de mãos dadas com a indústria farmacêutica. 
     Aqui vai o meu principal agradecimento: à todos os leitores do blog! Me tornei e me senti uma pessoa melhor ao ler seus comentários e agradecimentos. Tudo nesta vida tem um lado positivo se soubermos entender certas coisas. No meu caso em particular surtar ajudou a me entender melhor como pessoa. Durante a minha vida inúmeros sinais apareceram querendo dizer que havia algo de diferente em mim, mais em nunca percebi ou parei para pensar nisso. Até que chegava a pensar um pouco, mas não conseguia chegar em nenhuma conclusão. 
    Mas não reclamo, durante os surtos conheci muita gente boa, que, como já disse inúmeras vezes, me salvaram literalmente. Atualmente, no blog e no meu canal no youtube tento de alguma maneira retribuir, ajudando as pessoas que estão passando hoje  o que passei nos primeiros surtos. 
     Não falo muito sobre certos assuntos pois o mundo está cheio de pessoas que se aproveitam de certas situações para obterem lucro pessoal. São efusivas e sabem influenciar o próximo.. Mas o criador não precisa de câmeras e nem de microfones. E é à Ele que também vai o meu agradecimento final. 
  



terça-feira, 14 de março de 2023

O jejum forçado de diazepan

 Abstinência....

    Como vocês puderam perceber na postagem anterrior, está faltando o ansiolítico diazepan nos postos de saúde de Belo Horizonte. O motivo não tenho certeza qual é, pois os funcionários não costumam responder nossas indagações e depois reclamam que a gente fica pesquisando esses assuntos na web... 
    Mas, fazendo uma busca na internet descobri que a China tem dificultado o trabalho da indústria farmacêutica, visto que esse setor da economia tem poluído e muito o meio ambiente daquele país. E o Brasil importa matéria prima para a produção de alguns medicamentos justamente dos inventores da pólvora. 
    Sou um pacato cidadão, não gosto de confusão, mas confesso que em algumas situações sou um pouco teimoso. E essa questão de ter que comprar uma droga que não pedi para ficar viciado não entra em minha cabeça em hipótese alguma. 
    Vou explicar melhor: na minha primeira consulta com o psiquiatra, relatei os meus surtos e também que estava tendo dificuldades para dormir. O cara nem olhou na minha cara e já foi logo preenchendo o formulário da receita com o ansiolítico lorazepan, da família dos benzodiazepínicos. Na minha cabeça, esses medicamentos eram meio que milagrosos e nos fariam dormir o sono dos anjos, mesmo que o mundo estivesse caindo sobre nossas cabeças. 
     Naquela época estava dormindo nas ruas, ou melhor, tentando dormir, pois é um pouco perigoso um morador de rua ficar a madrugada toda exposto em uma calçada. Estava nas ruas por causa das vozes ameaçadoras, que diziam que iriam me pegar, me matar, etc.. A solução que encontrei foi fugir, pedindo demissão do emprego e mudando de cidade. Mas era uma tentativa de fuga de algo que estava em mim mesmo e não no mundo externo. Então, na minha modesta opinião o psiquiatra deveria pelo menos ter perguntando o motivo de não estar caindo nos braços de Morfeu. Era um motivo real, não era ansiedade sem um motivo aparente, os ansiolíticos não resolvem esses problemas reais do dia a dia. 
    Na época não tinha acesso à internet e na farmácia não me passaram a bula do medicamento, pois tenho a mania de ler tudo o que passa na minha frente. Não tinha a mínima ideia do que esses benzodiazepínicos podiam fazer em meu organismo. Não sabia que eles viciavam e que em pouco tempo iriam parar de fazer efeito, obrigando-me a voltar ao médico para aumentar a dosagem ou buscar um medicamento mais forte. Também não sabia também que eles detonavam nossa memória e que também poderiam aumentar as chances de ter alzheimer. 
    A indústria farmacêutica é muito poderosa e as propagandas dos ansiolíticos me fascinavam. Geralmente era uma pessoa dormindo tranquilamente em uma cama. A verdade é que para um insone crônico não é necessário ter muita criatividade para se fazer um comercial de algo que promete acabar com o que está acabando com a gente: a falta de um bom sono reparador e que nos faça acordar bem dispostos e de bom humor. 
    No meu caso geralmente tenho que descansar das noites mal dormidas, então o período matinal não é o melhor para se programar algo para fazer. Geralmente fico deitado, ouvindo música ou fazendo algo que não exija tanto esforço físico. Fico bem de tarde e de noite, talvez seja também o meu relógio biológico que me faça estar bem nesses horários. 
as propagandas dos ansiolíticos podem atrair os menos avisados

                                                Sou um dependente químico

    Hoje me considero um dependente químico, e não tenho vergonha disso. Crise de abstinência são alterações em nosso organismo que resultam em mudanças de comportamento e alucinações e outros sintomas decorrentes da falta de uma substância. 
    Comecei a usar essa droga de droga chamada diazepan no ano de 2002. Usava 10mg e, por volta do ano de 2006 tive que dobrar a dosagem pois não estava mais sentindo nenhum efeito ao me deitar. 
    Mas em dois meses os 20mg pararam de fazer o efeito inicial. Na época já tinha acesso à internet, pois estava no auxílio doença e havia comprado um computador CCE em suaves prestações nas Casas Bahia. 
    Então já sabia que a causa da minha memória não estar muito boa era o pan nosso de cada dia e não os meus 40 e poucos anos. E sentia que se continuasse naquele ritmo em breve iria estar tomando uns 50mg. Era o momento de fazer o desmame por conta própria. 
    Foi uma longa e difícil jornada, com dores de cabeça, palpitações no coração, e, claro, um pouco de nervosismo e irritação sem causa aparente. Mas, como muito esforço e uma redução lenta e gradual, hoje estou tomando apenas 4 comprimidos por mês! Infelizmente não consegui parar por completo, parece que o meu organismo fica pedindo a droga. Mas considero essa boa redução uma grande vitória, pois teve época que chegava a tomar 4 comprimidos durante o dia, não conseguia usar  os antipsicóticos por causa do trabalho e então usava o diazepan como um SOS. 

     Como não pedi para ser dependente de ansiolíticos, não acho justo ter que ficar comprando esses remédios. Infelizmente alguns profissionais da saúde mental agem meio como traficantes, pois ganham amostras grátis dos laboratórios e oferecem aos seus pacientes. E, quando já estão viciados, cessam o fornecimento e pedem para que eles comprem os medicamentos. E, acreditem, alguns psiquiatras ganham comissão para receitar medicamentos de certos laboratórios. Sei disso por que já vi os engravatados representantes desses laboratórios nas unidades de saúde que fazem atendimento de psiquiatria. 
    Se tiverem dúvidas, assistam ao filme Amor e outras drogas, uma comédia romântica que é meio baseada em fatos reais, pois foi ela foi inspirada num livro de um ex propagandista de um laboratório farmacêutico. 

A teimosia

Se você assistiu Spectroman você tem mais de 50...

     Por volta do ano de 2003 faltou diazepan na cidade onde morava. A atendente da farmácia falava que na "semana que vem" o medicamento iria chegar. E foi assim por quatro semanas seguidas.     Como resultado dessa falta do ansiolítico no meu organismo tive um surto violentíssimo. Bem, o surto foi violento, mas eu não ficava agressivo, minha reação era apenas fugir das vozes e dos meus pensamentos persecutórios. 
    Me lembro que certa madrugada ouvi uma voz de um homem falando em uma língua estranha, parecendo alemão. Logo imaginei que a voz vinha da igreja evangélica que se situava uns 100 metros da firma onde eu morava. Me causou espanto que a voz não parava um minuto sequer, e comecei a rir imaginado que o dono daquela voz iria ter um ataque do coração, pois ninguém conseguiria falar por tanto tempo seguidamente sem parar para respirar. 
    Depois de muitos anos, analisando a situação, cheguei á conclusão de que se tratava de uma alucinação. Afinal a igreja nunca havia ligado o som de madrugada, os cultos terminavam por volta das nove horas, no máximo. E, se tivessem usado o equipamento de som os moradores da rua teriam comentado e reclamado da noite mal dormida. 
     Tive uma outra alucinação auditiva bem estranha. Me lembro bem, era madrugada de sábado para domingo, umas duas horas, mais ou menos. Ainda estava acordado e era possível escutar a música que vinha de um salão de forró, que ficava ao lado da igreja. A música rolava solta até que resolveram dar uma parada, e, não sei por que, nesse instante comecei a ouvir uma voz tenebrosa, parecida com a do Darth Vader. E geralmente durante os surtos não questionamos se aquilo é verdadeiro ou não, as vozes soam muito reais em nossas mentes. Então imaginei que um enorme monstro gosmento estava subindo no palco do forró, e por esse motivo a música havia parado. Hoje sei que foi uma alucinação, pois no dia seguinte não ouvi nenhum comentário sobre monstros gosmentos invadindo show de forró. 
    E também sei que monstros gosmentos só existem em filmes de terror, existia no espectroman e também no desenho das Garotas Superpoderosas. Sim, eu cheguei a ver esse desenho e adorava aquela que era a mal humorada, a que usava roupa verde. Acho que era a Docinho. 
    Cheguei a ter umas duas alucinações visuais naquele surto. A maioria das alucinações que tive e ainda tenho são auditivas. Às vezes parece que tenho alucinação olfativa, pois sinto um cheiro estranho, parecendo de algum produto químico, mas não imagino qual seja. Enfim, não sei se é verdade ou alucinação. Mas uma das alucinações visuais que tive era a de um machado vindo em minha direção. Me lembro que naquele momento até me abaixei para desviar da rota daquela ferramenta de corte de madeira. 
    Outra alucinação visual que tive naquele surto foi a da cadela da proprietária da firma. Ela apareceu morta no jardim, com as patas para cima, sem respirar e um pouco inchada. Cheguei bem perto dela para ver se respirava. E, como não se mexia corri para o meu quarto. Mas, logo depois a vi andando normalmente pelo galpão. Gostava muito dela e foi aquele ser que me fez companhia naqueles momentos tão difíceis da minha vida. 
     Tive também vários delírios, um dos mais estranhos que tive naquela época era a de que o mundo estava acabando, principalmente quando via poucas pessoas nas ruas. Imaginava que elas haviam fugido para um outro lugar, em uma tentativa de escapar de uma catástrofe ou coisa parecida. Cismava de que um planeta ou meteoro gigante iria colidir com a terra. 

Como é a minha abstinência atual

     Como decidi por um tempo não comprar algo para alimentar o vício de algo que não pedi para viciar, fiquei certa de quatro semanas sem usar o diazepan. Fiquei muito irritado e meus colegas fominhas do futebol do centro de convivência sofreram um pouco comigo. Uma das coisas que não gosto na pelada são aqueles caras fominhas que não tocam a bola e só pensam em fazer gol para se gabarem no final. 
    Não tive paciência com um monte de gente. Mas teve um lado legal, fiquei rindo mais, um pouquinho mais agitado também. Minhas emoções ficaram mais afloradas, tanto as positivas como as negativas. E minha libido aumentou bastante também, algo que não tem tanta utilidade hoje em dia, pois nem confusão estou conseguindo arrumar. 
    Com essa forçada abstinência a minha mania de perseguição, que já é alta, pulou para níveis alarmantes. À todo instante ficava imaginando que estavam tramando algo contra a minha pessoa.
A minha mania de perseguição atual também é virtual, ou seja, está pior do que no início, pois penso que estão hackeando o meu notebook e que sabem tudo o que acesso e digito.  Pensei em sair por aí viajando de bike, mas imaginava que nas estradas iriam me perseguir também. 
   Enfim, a mania de perseguição é uma das coisas mais incapacitantes que já conheci. Claro que tem os níveis desse delírio. Pode ser apenas uma cisma, uma neurose e, se não for tratada pode sim virar uma psicose. É como qualquer outra doença, quanto mais cedo diagnosticada e tratada, maiores são as chances de cura. 
   Além de tudo isso, sem o diazepan por muito tempo fico sem conseguir me relaxar. A musculatura fica tensa e acordo muito cansado. Meu cérebro fica "tagarela", como se estivesse várias pessoas conversando na minha cabeça. 
    O jeito então foi comprar uma caixa com 30 comprimidos. Na primeira noite já senti um enorme alívio. Dormi relativamente bem e relaxei meus músculos. Fiquei menos ansioso e calmo, com os pensamentos mais ou menos em ordem. Como seria bom se os medicamentos para combater os transtornos mentais não tivessem efeitos colaterais!
    Muitas pessoas não me entendem, não sou contra os medicamentos e nem contra quem os receita. Sei que tem muito profissional da saúde mental bem intencionado. A minha luta e reinvindicação é para que descubram medicamentos que tenham eficácia mas com nenhum ou pelo menos poucos efeitos colaterais e reações adversas. 
    Queria também que os médicos tivessem critérios para liberar uma receita desses medicamentos que alteram o nosso cérebro. Deveriam fazer perguntas e dar conselhos. Medicamentos só em último caso, o Brasil é campeão mundial no uso do rivotril e outros ansiolíticos e antidepressivos
Muitas pessoas imaginam que antidepressivos possam fazer milagres, que podem nos deixar felizes e contentes mesmo com uma situação não muito boa. Já vi uma mulher na farmácia de um posto de saúde comemorando uma receita da fluoxetina mesmo sem estar com depressão. Esse medicamentos geralmente tem como efeito colateral a perda de peso... 
     Uma amiga minha gostava de usar ritalina, ela dizia que a deixava animada e que tinha um efeito parecido com o da cocaína. Enfim, existem diversas ocasiões em que uma pessoa solicita ao médico determinado medicamento sem realmente estar precisando dele. . 

Além do diazepan


                                                  Além do diazepan, o que me acalma?

    Costumo dizer que cada pessoa tem a sua válvula de escape para a ansiedade: alguns usam o álcool, outros a maconha e outros drogas mais pesadas. E não somente isso, existem várias outras coisas que são usadas para o alívio desse mal que assola a humanidade dos tempos atuais. E algumas dessas coisas são saudáveis, como os esportes, que liberam a endorfina e nos relaxam. 
    No meu caso em particular não uso drogas, mas vou para um caminho que também não é muito saudável: me empanturrar de comida, preferencialmente doces, bolos, tortas, chocolate, etc... 
   Além de fazer mal à minha saúde tem também o prejuízo financeiro, boa parte do meu salário vai para a padaria, pois já gosto de doces naturalmente. Quando fico ansioso a situação fica crítica e chego a comer uma caixa de bombons em uns dez minutos. Esse é um dos vários motivos pelos quais não uso os antipsicóticos, pois eles aumentam e muito o nosso apetite e então meu estômago parece não ter fundo. Então não seria boa parte do meu salário e sim ele todo que iria para a padaria....
    O futebol ajuda e muito a tirar um pouco a minha ansiedade e o meu stress. Correr, gritar, extravasar é sempre bom. Mas hoje em dia não posso e nem consigo jogar bola todos os dias. Comecei então a pedalar e está sendo muito bom. É um esporte que recomendo à todos. 
    Esse bem estar produzido pelos alimentos, pelas atividades físicas, às vezes causado por alguns medicamentos me fazem pensar se a felicidade é química.
       Quando como chocolates me sinto tão bem e disposto que nada me importa, esqueço de todos os problemas e fico sorridente. Mas quando não como fico parecendo o personagem principal da série After life. Depois do futebol geralmente como chocolates ou tomo um sorvete de chocolate. Tudo fica azul, até canto (para a tristeza dos meus vizinhos). Baixo músicas novas de músicos que não conhecia e as acho muito legais e interessantes. No dia seguinte, sem a endorfina e outras inas mais causadas pelo futebol deleto um monte de canções que me pergunto como fui perder o meu tempo de baixá-las. 
Enfim tudo fica meio cinza, não que eu saia descontando o meu mau humor em todas as pessoas, apenas evito o contato com a maioria dos seres humanos. Seria mais estado de ânimo do que mau humor. Nada tem graça e fico me perguntando o motivo das pessoas estarem rindo. 
       Quando estava morando nas ruas por causa dos surtos por um certo período morei em um albergue para pessoas em situação de rua. Precisava de um endereço fixo para tirar novamente todos os meus documentos. Uma vez na entrada vi um senhor que morava no abrigo e que em um chuvoso dia na fila para entrar no abrigo estava todo sorridente. Ele vendia picolés e provavelmente não teve um bom lucro naquele dia. Mas seu sorriso me deixou intrigado: como uma pessoa que mora em um abrigo conseguia sorrir em um dia de chuva enquanto outras pessoas com bom poder aquisitivo são mau humoradas?
    Afinal, o que é a felicidade? Está em algum lugar, em algo, ou em dentro de nós? Ou é um conjunto de coisas?
    


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