quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Desistências

 Quem nunca passou por momentos difíceis em suas vidas?


    

    Depois que a esquizofrenia apareceu em minha vida, tive vários momentos de desânimo total, a ponto de tentar o autoextemínio ou então ficar inerte à tudo e à todos.
    Um dos piores momentos foi em 2004. Estava tão debilitado fisicamente e mentalmente que pedi demissão da firma onde trabalhava, em uma pequena cidade do  interior de Minas Gerais. 
    Com a grana do acerto, fui em uma churrascaria para fazer a minha última refeição, e depois fui na casa da luz vermelha para ter a minha última transa. Estava mais aliviado do que desesperado. Acho que estava me sentindo mais leve por não ter que ver mais tantas pessoas. Estava tão tranquilo que fiquei ouvindo a garota de programa falar sobre seus problemas conjugais, que havia ido para aquele lugar pois seu marido era muito violento.
    No dia seguinte comprei um colchonete, um radinho e um monte de pilhas. Não tinha mais coragem de tentar tirar a minha vida, então queria deitar em uma calçada, ligar o radinho de pilha e ficar lá até morrer. 
   E fiquei assim sexta feira e todo o final de semana. Na segunda feira começou a agitação no centro, várias pessoas passavam pela calçada para me ver. Tive que tomar diazepan acho que de hora em hora para não surtar. Apareceu um policial e me deu um tapa nas costas, pois eu estava deitado de bruços. Depois apareceu uma ambulância e mais policiais. Provavelmente alguém havia me denunciado por estar tomando medicamento por seguidas vezes. Eles não foram muito amigáveis comigo. Mas, antes que me abordassem novamente apareceu uma assistente social e foi possível ouvir ela dizendo que me conhecia e que eu era um cara trabalhador e que não usava drogas e que gostava de praticar esportes. O policial até veio a se desculpar comigo. 
    Então fui levado para um albergue e permaneci por lá por mais de um ano, convivendo com ex detentos, pessoas em situação de rua e trecheiros que viajam pelo Brasil meio sem destino certo. Comecei a fazer o tratamento e hoje estou indo bem, não estou curado, mas só tenho que agradecer por estar vivo para poder contar estas histórias. Acho que meu anjo de guarda trabalha muito bem e que sou um cara de sorte, apesar de não ser rico e só ter uma bike usada e uma tv LCD de 32 polegadas. Ah, e tenho um notebook da Dell, que consegui comprar quando estava viajando por aí com a minha mochila economizando a grana do aluguel. 
   Mas me considero um cara de sorte, não era nem para estar vivo, mas estou. Estou vivo e ainda consegui me entender um pouco como pessoa após os surtos. Loucura para mim hoje em dia é querer agradar à todos deixando de ser você mesmo. 
   Podemos tirar lições até das piores situações em que vivemos em nossas vidas. 

18 comentários:

  1. E sua mae com seu pai o que aconteceu com eles? Quantos anos vc tinha quando apareceu a esquizofrenia?

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    1. Saí de casa aos 17 anos e não voltei.
      Acredito que a esquizofrenia sempre esteve comigo, desde a infância, pois a esquizofrenia não é somente os surtos, é também um conjunto de comportamentos e pensamentos.

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  2. Quando entrou na casa da luz vermelha escolheu serviço completo ou só transa?

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    1. Foi só uma transa mesmo e antes fiquei cerca de duas horas conversando com ela. Apesar da situação complicada eu que fiquei ouvindo a garota relatar seus problemas conjugais.
      A intenção era ficar o mais tranquilo possível pois iria ficar nas ruas sem objetivo nenhum, apenas deitado no colchonete. E naquela época as vozes incomodavam muito ainda, então relaxar ajudaria um pouco.

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  3. Que bom que você escreveu. Já faz um bom tempo, que venho passando por um momento ruim, difícil. Porque apesar de ter transtorno bipolar, sou mãe de um garotinho de 7 anos. Que precisa muito de mim. Me preocupo se ele pode herdar minha doença, me preocupa tornar o ambiente saudável pra ele. Mesmo usando medicação de vez em quando tenho surtos. Tô aprendendo a me controlar, não deixar transparecer. Trabalho tá cada vez mais difícil. Você disse tudo ainda sentimos que podemos conviver com uma doença mental e disfarçar pras pessoas. Parabéns você nos ajuda com seus textos, suas histórias. Abraço, fique bem!!

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  4. Seu blog é um refúgio, nunca deixe de escrever enquanto tiver forças, acompanho sempre...
    faça mais lives se puder!! abraços !!

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    1. Obrigado. Vou continuar sim a escrever, essa postagem fiz pois no grupo esquizofrenia do face uma pessoa falou em desistir de tudo.
      Fazer lives é um pouco difícil pois a net aqui não é muito boa, mas vou sempre continuar a enviar vídeos.
      Obrigado pela visita ao blog.

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  5. Parabéns Júlio!! Nunca desista vc e um vencedor.

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    1. Obrigado.
      Na verdade publiquei essa postagem pois uma pessoa de um grupo no facebook havia postado sobre desistir de tudo. Aliás sempre aparecem essas postagens, aí resolvi fazer esta publicação, pois me lembrei desse período difícil em minha vida.
      Atualmente está indo tudo bem, com exceção dos efeitos da pandemia, que está prejudicando a maioria das pessoas.
      Mas isso vai passar.

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  6. Na altura que transou com a menina já havia o covid19?

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  7. Oiii muito obg por me convidar pra vim visitar aqui ta me fasendo bem saber que voce se importa com as pessoas com tanta atensaõ vivo isolada pois ja naõ sei mais quem sou eu Milll Gratidão pela atensaõ

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    1. Olá. Também vivo meio isolado, mas atualmente é mais por opção mesmo, o mundo em que estamos vivendo está cercado de ódio e falsidades.
      Mas,claro, existem pessoas verdadeiras e boas ainda, e tenho esperanças que algum dia mude tudo isso.
      Fique com Deus.

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  8. Eu acho que desisti. Não sei... Eu às vezes sinto vontade de sair de casa e ficar num canto esperando a morte, igual ao que vc fez. Mas ainda dou aulas particulares aqui em casa e arrumo a casa... faço uma coisa e outra.

    Acho que tenho perdido minha fé em Deus. Sei que ele existe, mas há pessoas que têm doenças debilitantes, como é a esquizofrenia, ou a cegueira, ou a surdez, ou a paralisia... a gente sabe que essas pessoas não são como as demais; tudo é mais difícil pra essas pessoas. Aí eu pergunto: por que Deus permite que essas coisas existam? Eu me sinto tão impotente. Alucinações eu nunca mais tive. Mas a esquizofrenia vem acompanhada de outros problemas igualmente debilitantes: insônia, depressão, pânico.

    Eu não sei se há condições de eu dar aula (sou professor). Fiz um concurso pra professores de escola pública e fiquei em oitavo lugar, mas não sei se tenho condições de dar aula.

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    1. Também fazia esses questionamentos sobre Deus, hoje em dia depois de tudo que passei parei de procurar respostas e viver um dia de cada vez.
      Por que não tenta dar aula? Só saberá tentando...

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    2. Eu dou aulas particulares. E já tive muitos episódios de pânico dando aula para um só aluno. Tem sido difícil...

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  9. Boa tarde! Tudo bem? Eu queria te perguntar se você encontrou apoio psicológico e psiquiátrico, faz 5 anos que fui diagnosticada com esquizofrênia paranóide, faço tratamento, mas confesso que não encontrei muito apoio efetivo de profissionais na área, passei pelo interior de Minas Gerais também e agora estou de volta a São Paulo. Sobre as vozes, tive pouca oportunidade de falar sobre o assunto, queria também entender de onde elas vêem, as vezes chego a pensar que tenho múltipla personalidades, considerando o número de vozes que eu ouço, mas ainda não recebi um diagnóstico sobre isso.

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    1. Olá
      No início a situação em relação às consultas foi bastante complicada. Elas costumavam demorar entre 5 a 10 minutos. E as primeiras consultas são importantíssimas, pois quanto mais cedo acertar no tratamento, melhor.
      Não me falaram nada sobre o que era um transtorno mental, e então ficava imaginando se tratar de algo espiritual.
      Depois de cerca de dois anos, quando já não estava mais conseguindo trabalhar, fui para as ruas e aí me levaram para uma cidade onde o tratamento era mais digno e as consultas podiam demorar até meia hora. Havia mais diálogo e dei uma boa melhorada.
      Enfim, a qualidade no atendimento varia muito de município para município e também de profissional para profissional.
      Em relação às vozes, realmente algumas delas não sei explicar como apareceram, pois não tinham sentido nenhum e também as vozes ameaçadoras não sei de onde vinham.
      Já algumas vozes, as que me acusavam de algo, creio que vinham de dentro de mim, algumas com sentido, me culpando de algumas coisas que fiz de errado em minha vida, já outras não tinham sentido, era um sentimento de culpa muito exagerado, tudo o que havia acontecido de errado a voz me culpava.
      Talvez no seu caso tenha a ver com a consciência.
      Obrigado pela visita ao blog.

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